Eu sou louco!

Irreverência, humor, criatividade, non-sense, ousadia, experimentalismo. Mas tudo pode aparecer aqui. E as coisas sérias também. O futuro dirá se valeu a pena...ou melhor seria ter estado quietinho, preso por uma camisa de forças! (este blog está registado sob o nº 7675/2005 na IGAC - Inspecção Geral das Actividades Culturais)

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terça-feira, maio 03, 2005

Camurso!

O meu pai tinha três irmãos.
Um mais velho, Manuel de seu nome, e dois mais novos, Gilberto e António, sendo este o benjamim.
Já todos faleceram. O último foi o António, que morreu no verão passado com 78 anos.
António (ou o tio Tone, como lhe chamava) era o bem disposto do grupo.
Sempre bem humorado, dizer piadas era com ele. Falava pelos cotovelos. E tinha um descaramento, uma total ausência de timidez, que deixava os irmãos muitas vezes embaraçados. Mas não era inconveniente. Tinha o sentido das proporções.
Foi casado, depois viúvo, mas não teve filhos. Meu pai, que nem sempre estava disposto a aturar tanta irreverência, dizia muitas vezes em tom de censura paternal:
- Se tivesses a responsabilidade de sustentar e educar dois filhos, como eu, não andavas sempre com essa boa disposição.
Mas não deixava de lhe achar piada!
Pois o meu tio António também era um portista ferrenho.
E, nomeadamente nos anos 60, muitas vezes ía com o mano Fernando (quero dizer, o meu pai) comigo e com a minha irmã para as bancadas do já desaparecido Estádio das Antas para ver o Porto jogar.
Como vivíamos bem pertinho, chegávamos cedo e sentavamo-nos (ou colocavamos umas almofadinhas) nos degraus de cimento que constituiam a bancada. Havia uns grupinhos que íam para a mesma zona e conversávamos uns com os outros. E não só sobre futebol.
Bom! Há uma correcção a fazer: o meu tio normalmente chegava mais tarde, mas o irmão marcava-lhe o lugar. E quantas vezes já estava a bancada cheia, as pessoas a cobiçarem o lugar do tio Tone, e o meu pai a desabafar:
- Qualquer dia deixo de lhe marcar lugar! Ainda tenho alguma discussão por lhe estar a guardar a almofada. Que raio de homem! É sempre o mesmo!
Mas o António nunca faltava. E mal nos via, com o seu potente vozeirão, característica bem distintiva, berrava:
- Ó Fernando! Já cheguei!
ou
- Ó irmão! Já cá estou!
- Agora põe-se aos berros! Parece que não teve educação! – resmungava o discreto mano Fernando.
Começado o jogo (não sei se já assistiram ao vivo a um jogo de futebol) lá vinham as palmas, os assobios, os incitamentos, os apupos, os impropérios. Uma delícia para um sociólogo. E não só! Minha irmã deleitava-se a apreciar o comportamento da multidão. Era o grande prazer dela.
E os árbitros?
Bom! É bem conhecido que são sempre o mau da fita. Quando o pessoal da bancada achava que ele tinha prejudicado o Porto, parte dele levantava-se e aqueles conhecidos nomes em vernáculo ecoavam durante um pequeno intervalo de tempo.
Claro que o tio Tone ajudava à festa!
Mas, de vez em quando, resolvia fazer o seu solo.
Solo? Sim, solo!
Eu explico!
Quando a multidão vociferava palavrões contra o homem do apito e seus auxiliares (os bandeirinhas, como se chamavam na época), o nosso protagonista mantinha-se impávido e sereno.
Mas quando o bruaá amainava, ele levantava-se e bradava na sua voz de trovão:
- Camurso!
E era ver centenas ou mesmo milhares de cabecinhas a voltar-se para o ponto donde partira o berro.
Quando achava que tinha auditório suficiente, explicava alto e bom som:
- Camurso quer dizer 50% camelo e 50% urso!
E sentava-se calmamente com um irreprimível ar de gozo e perante a gargalhada geral!
Ainda hoje, uma velho amigo que algumas vezes assistiu à cena, se refere ao tio como: “o teu tio camurso”.

13 Comments:

Blogger Fragmentos Betty Martins said...

António

As tuas histórias, têm um carinho, uma ternura como poucas. Vivências reais, momentos de vida, transformas em deliciosos "contos" de tão agradavel leitura.

Um beijo

1:13 da manhã  
Blogger Unknown said...

Recordar é viver, essa história tá na tua cabeça, nós quando crianças registamos tudo eu lembro de ido ver o meu Braga, com as minhas amigas,claro entrava só na ultima meia hora pois era de graça, e de quando em vez vinha um palavrão daqueles de deitar por terra qualquer civilizado eu olhava e procurava a pessoa com os olhos até a localizar, só que por vezes eram tantos os palavrões que eu ficava super envergonhada.bjs

4:50 da tarde  
Blogger BlueShell said...

heheeh...um tio muito bem disposto. conseguiste transmitir perfeitamente as circunstãncias e caracterizar as parsonagens. Sei que já foste sócio do FCP...mas que agora já não és...embora continues a ser um "portista ferrenho"...Olha...eu...bem...como dizer isto...é assim...Eu sou mais para o "Vermelho , vermelhão"....entendes? BENFIQUISTA...hehhehheheh.....
já sei, já sei...dei-te um desgosto...até as pedras vão chorar...ai agora é que vão...
Jinho vermelho..BShell

8:07 da tarde  
Blogger Fragmentos Betty Martins said...

António vai até ao "InApto" que é bem divertido o link está no meu "Fragmentos"

também posso esvrever aqui o link, caramba!!!

http://vbeiras.blogapraai.com.pt

Se não conseguires vai então ao meu "Fragmentos"

E diz-me se gostaste!

Beijinhos

2:09 da manhã  
Blogger Fragmentos Betty Martins said...

No link a seguir ao ao (.com) não leva o . (ponto)

Despulpa a trapalhada :-))

2:13 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

ah ah! eu contava-te uma da minha terra, verídica... mas envolve a mãe do árbitro, podes imaginar... as mães dos árbitros nunca devem ir ao futebol, pra seu próprio bem !!! :)

2:55 da manhã  
Blogger Fragmentos Betty Martins said...

António

Foi um pouquinho confuso! mas percebeste :-)

Eu não conheço quem escreve, mas o próprio deixou-me um Post e mais tarde, alguém me fez a mim, o que eu te fiz e fui "ver"
achei interessante, pela forma desprendida. Sabe bem de vez em quando ler a actualidade pelo lado caricato.

Beijos

9:21 da tarde  
Blogger RD said...

Sim, na nossa terra também temos umas tipo "ti tone", não sei se a Caiê se lembra da D.Adelaide, mas era uma senhora, mãe dum treinador na altura, levada da breca. Ninguém tinha coragem de se sentar ao lado dela por causa da vozeira e dos puxões. :) Adeptos... :)
Bonita história António!
Um beijinho*

1:56 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Adorei a magia desta história!

Um abraço e bom fim de semana :-)

6:11 da tarde  
Blogger BlueShell said...

So desejar um bom fds, Jinho, BShell

7:10 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Carinhosa a forma como descreves as tuas lembranças
Abraço

8:10 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Voltei da semana academica!
Quer dizer, foi académica, mas n participei! Só que n pude vir à net!
Ai...os teus textos...
Também tenho um tio assim!
E o meu cunhado? è mais maluqinho que o teu tio!

:)
:*

11:08 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Best regards from NY!
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9:03 da manhã  

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