Eu sou louco!

Irreverência, humor, criatividade, non-sense, ousadia, experimentalismo. Mas tudo pode aparecer aqui. E as coisas sérias também. O futuro dirá se valeu a pena...ou melhor seria ter estado quietinho, preso por uma camisa de forças! (este blog está registado sob o nº 7675/2005 na IGAC - Inspecção Geral das Actividades Culturais)

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sábado, maio 07, 2005

O que penso do ensino básico

Comecei a escrever um comentário no blog “Fábulas” da Saltapocinhas e a certa altura verifiquei que me tinha entusiasmado e escrevera muito mais do que tinha pensado inicialmente.
E também que acabara por expressar, de forma sucinta mas relativamente correcta, o meu pensamento essencial em relação ao ensino básico, que é a caixa de Pandora do nosso sistema escolar, neste momento e na minha opinião. Mas a responsabilidade não pertence aos professores (apetecia-me dizer: professoras). É dos responsáveis políticos. Dos governantes. E sobretudo de pseudo-pedagogos que parece que gostam de tratar as nossas criancinhas como cobaias.
Por isso resolvi transcrevê-lo para aqui. Com alguns ajustes.

Ao lerem o texto que se segue, não pensem que advogo o retorno às origens (acho que ainda não fossilizei).
Tão-somente que alguns princípios essenciais deveriam ser revistos à luz do que exponho.
Após este longo intróito, eis o comentário que resolvi transpor para aqui:


Nos anos 50, época em que fiz a primária de acordo com os cânones do salazarismo, havia turmas só de manhã ou só de tarde (pelo menos na minha escola).
Aprendia-se tudo e mais alguma coisa. Memorizava-se imenso. Claro! Naquelas idades a memória é fabulosa. Muitas coisas não eram percebidas nessa altura, mas sê-lo-iam mais tarde, nas mais variadas circunstâncias.
Mas também se aprendia a raciocinar. Fazíamos problemas que eu próprio, mais tarde, me perguntava como tinha conseguido resolver.
A criatividade era tão grande que desenvolvê-la não era muito importante. Orientá-la, isso sim.
Na 3ª classe já havia um exame. Fácil. Treino para o ano seguinte.
Na 4ª classe havia aulas de manhã, mas de tarde íamos quasi todos para casa da professora, todos os dias, das 2 às 7, para sermos bem “puxados”. E depois tínhamos o exame da 4ª classe, e ainda o de admissão aos liceus ou escolas técnicas. Penso que ambos a nível nacional. Que me conste, nunca nenhum de nós ficou marado ou traumatizado ou morreu de fadiga. Alguns chumbavam. A quantos eu vi que um ou dois chumbos fizeram bem! Deu-lhes tempo de amadurecimento e acabaram por se tornar dos melhores alunos.
Ah...e ainda apanhávamos reguadas, canadas e puxões de orelha.
Em suma: Faziam-nos aquilo que acho que não se faz hoje:

Obrigavam-nos a usar a cabeça, assim desenvolvendo as várias funções intelectuais.
Preparavam-nos para a vida, criando-nos dificuldades que resultavam em maior sentido de responsabilidade
Instruíam-nos, fornecendo conhecimento fundamental e geral.
E até nos complementavam a educação doméstica!
E até tínhamos a catequese ao domingo (coisa horrorosa!).
Actualmente, parece-me que tratam as criancinhas como "bibelots".
E os alunos de hoje até são mais desenvoltos que os de há cinquenta anos. Acho eu!
A escola actual não cumpre bem o seu papel: desenvolver a mente, instruir e responsabilizar.
Agora, por favor, contem até dez antes de me chamar reaccionário! É que não o sou! Mas sei que naquele tempo havia também algumas coisas mais correctas que hoje.
E se há coisa em que a 3ª República tem falhado estrondosamente é na Educação.
Não será verdade?


15 Comments:

Blogger Leonor said...

António
já deves ter percebido pelas coisas que eu falo no Ex improviso que eu sou professora do 1º ciclo.

ainda fiz a primária no tempo do Marcelo.Tenho alguns livros antigos... e seja como for, do mal o menor, as coisas mudaram graças a deus.

acontece que muitas vezes ao implantarmos a mudança não pesamos bem os prós e os contras e erramos. mas é com o erro que nos aperfeiçoamos.

a meu ver, há uns que vêem os erros mais depressa que outros e quem vê não precisa de fazer tudo como está no papel.

em chelas, onde estou, os miudos nâo têm as mesmas capacidades cognitivas e socio afectivas que outros noutras escolas, e tu pensas que eu sigo o programa educativo com todas as mariquices que me obrigam a dar? ensino aquilo que eu vejo que eles podem aprender. Porque vejo que isto é tudo muito bonito mas aqui não funciona. e ajo por conta própria e risco. no fim, se for preciso logo justifico a minha acção.

hoje também se memoriza, até porque a idade em que eles se encontram só dá para assimilar - não é por acaso que se começa só aos 15 anos o estudo da filosofia -
mas memorizam-se outras coisas.

e o uso da régua... muitas vezes faz-me falta uma régua, mas ainda bem que não a tenho e ainda bem que muitas colegas minhas não a têm. e tenho sobrevivido sem a régua e eles têm crescido sem a régua.

António, hoje as coisas estão mal no ensino mas cabe-te a ti na tua sala de aula fazeres o que achas certo - chama-me anarquista, não me importo - mas antigamente eram bem piores.

abraço e desculpa a seca desta leonor

8:27 da tarde  
Blogger António said...

Quando resolvi exibir aqui este texto, fi-lo com a plena consciência de que trata de um tema polémico.
Polémico mas da maior importância para o futuro deste país.
Não tenho nenhuma relação com o ensino básico, para além de a minha mulher ter sido professora primária (reformou-se há cerca de um ano) e de ter acompanhado os estudos de um enteado e do meu filho.
Mas procuro ser um cidadão atento. Converso muito e com muita gente, incluindo professores de graus mais avançados. Sobretudo da minha geração.
Também leccionei, mas por pouco tempo no ensino superior e no 12º ano.
Aliás, estive no ano de arranque do 12º, trabalhava já na indústria privada, porque muitos profissionais do ensino não se sentiram preparados para essa tarefa. Eu fi-lo, dando aulas à noite, depois de um dia de trabalho em ambiente fabril. E fazendo bastante esforço para preparar as aulas. Mas acho que me saí bem.
Mas não me referi, naturalmente, às situações mais complicadas de alunos de meios sócio-económicos degradados, ou deficientes ou ao ensino especial.
Nem procurei ser exaustivo.
Fiz a minha análise e emiti uma opinião que já formei há muitos anos.
Peço a quem ler o texto que o faça na perspectiva de quem procura ver a floresta e não só alguma árvores.
Foi assim que o escrevi.

9:41 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Bem, apesar da minha tenra idade,e de eu ter feito a primaria e o liceu, com muita calmia, admito que tens razão!
Até porque o meu pai, que tem a tua idade (já viste?), está sempre a contar essas historias e eu entendo-as e ceito-as perfeitamente.
Apesar de hoje, em algumas escolas (nomeadamente na Sra. da Hora, através dos meus sobrinhos) estarem a fazer programas especiais de ensino, em que têm disciplinas como Educação Cívica, Capoeira, Música, Piscina (isto na primária). Parece que está a correr muito bem, e são rigorosos com as crianças quando se trata de responsabilidades.
Mas de resto, já não estou muito por dentro disso...
Vocês que sabem, que resolvam!
Eu ca vou aceitando, até ter filhos e viver isso na pele.

:)

11:22 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Absolutamente de acordo. O ensino é o calcanhar de Aquiles dos tempos modernos.
O ensino precisa não de reformas. Precisa de um ruptura.

8:49 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

a reforma de veiga Simão ainda hoje é re-estruturada por mentes acéfalas...a ruptura é necessária. O conhecimento...não tem servido para aproximar os Homens. Já ninguém é obrigado a uma construção de significado, é a forma de nos massificarem, de nos retirarem a individualidade e a criatividade. "Matam-se" crianças motivadas nos bancos das escolas, de costas umas para as outras que é como é levada a vida...desculpa por não conseguir dizer muito e por vir aqui deixar o descontentamento...voltarei porque gosto de blogs sérios...

9:37 da manhã  
Blogger Fragmentos Betty Martins said...

António

O ensino está mau! todos nós sabemos, precisa de verdadeiras reformas, é uma realidade. Quem o pode e deve fazer, não faz!!! Torna-se complicado para os alunos,e para os professores, principalmente para aqueles professores, que não se limitam a "vomitar" matéria, (desculpa a expressão, mas é o que eu penso)

Nesta fase de desenvolvimento dos jovens alunos, muitas vezes, os professores são compelidos a fornecer soluções, são seduzidos pelo imediato, pelo resultado, impulsionados pela celeridade do novo milénio, sem que se pondere o tempo de maturação em que deveriam ser trabalhadas as competências heurísticas. Neste período de adaptação correspondente ao ensino básico (terceiro ciclo) e secundário, a organização curricular deve não só seleccionar rigorosamente a informação, como também conhecer e avaliar os processos pelos quais se combina. Na viagem que queremos realizar, a bússola de que todos necessitamos, é pois, o conjunto de capacidades para avaliarmos as nossas respostas e as de outros, com a seriedade que é acicatada pela ironia dos que conhecem os seus limites e os sabem recriar pelo diálogo, pondo à prova os saberes e competências.

Frequentemente, não pensamos a escola como um processo de transmissão de responsabilidades, em que o papel de cada um deve ser claramente definido para que a comunicação se estabeleça. Todavia, no acto de ensinar, quantas vezes, o professor omite o preceito de responsabilizar o aluno no acto de aprender, sem lhe estimular a autonomia do que deve aprender, não deixando espaço para que cada um avalie os seus resultados e as estratégias mentais que utilizou ou que deveria ter utilizado. A responsabilização, nesta perspectiva pedagógica, será um meio para a autonomia se construir, porque esta só se pode alcançar se aprendermos a aproveitar todas as situações formais e informais que se nos deparam. Dizer que o ensino está mau e ficar-mos po isso mesmo, nada vale.
Isto é um problema que o "Sistema" tem que resolver, envolve várias partes; professores, alunos e pais.

Este é o meu pensamento talvez ingênuo, não sou professora, mas sou uma cidadã atenta.

Um beijo

4:30 da tarde  
Blogger saltapocinhas said...

Então agora falo eu: tens razão em muitas coisas, mas sair do 800 para o 8 tb não é solução.
Muito está mal no ensino, mas ainda assim muito melhor do que quando tu andavas na escola (conheço bem esse período, és da idade do meu marido). Eu só entrei nos anos 60 e nessa altura as coisas já eram ligeiramente diferentes. Tive uma professora muito "má" no 1.º ano mas depois passei para uma "boa" e não fiquei traumatizada. Aquela história que contas dos alunos irem para casa da professora, era só para alguns: só para os melhores, os que iam seguir estudos!! E os outros?? Andavam na primária até aos 14 e depois iam trabalhar. da turma do meu marido só 2 continuaram estudos para além da 4ª classe. Da minha turma fomos quase todos para o ciclo (5º e 6.º anos) mas que eu saiba só 3 de nós continuaram os estudos...
Agora toda a gente vai estudar e isso faz descer imenso a fasquia e "estraga" as estatísticas! Mas, mesmo assim, eu prefiro as coisas como elas são agora: os alunos gostam de nós (antigamente chamavam "respeito" ao que afinal era puro terror!!).
Os meus ex alunos se me vêem correm para mim, cumprimentam, contam as suas coisas.Nada disso acontecia dantes! Se víamos a professora na rua, fugíamos para o outro lado...
Agora falta o governo cumprir a sua parte e deixar de fazer experiencias com professores e alunos. Estamos todos FARTOS de sermos cobaias!

6:11 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Também sou profe, embora bem longe do básico. Mas concordo inteiramente que se essa base não for bem fundamentada, o resto nunca se erguerá convenientemente. Os miúdos que conheçam têm muito pouca consciência de tempos verbais, regência de verbos, conjunções, etc... muitas vezes porque não faz parte dos programas ensinar-lhes isso! A culpa não é nem deles nem dos profes... mas do Ministério, que escolhe ao invés do ensino a promoção do deixa andar... Enfim. É a lei do tudo se resolverá um dia. Quando???

10:14 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

desculpem,,, errata: os miúdos que conheço. LOL

10:15 da tarde  
Blogger António said...

Agradeço a todos os que tem expressado uma opinião sobre este tema.
E espero que ainda haja mais contributos.
Não vamos chegar a nenhuma conclusão, mas pelo menos pensamos no assunto (embora, como já verifiquei que a maior pare das pessoas que comentam as minhas tretas são professoras, devem pensar nele todos os dias; eu só penso de vez em quando...eh eh )

10:37 da tarde  
Blogger RD said...

Julgo te ter entendido António. Não estás a pedir preferências entre um ou outro, queres apenas salientar o que de melhor o teu tinha... e eu concordo em pleno.
Os meus professores da primária foram pessoas com a tua idade e aprendi muito com eles. Primavam pela aprendizagem do raciocínio e para perdermos a preguiça mental.
Hoje é diferente nesse aspecto sim. Digo-o desde o básico até à universidade, e pelo que vejo em relação a colegas também.
Sou de Filosofia e no nosso curso, ao contrário do que a leonoretta disse, o que interessa não é memorizar (ou percebi mal). Interessa saber levantar questões que é bem mais importante do que dar respostas, e assim facilita-as.
Interessa sabermos relacionar o conhecimento com a vida e dar-lhe uso. etc.
O que acontece é que vejo a diferença de preparação dos mais velhos que vêm dum ensino mais antigo para os mais novos. Não tem nada a ver.
N A D A!
Hoje pode ser muito bonito e sim, temos coisas que nenhum de nós trocava por nada e sabemos todos reconhecer isso, mas que muita exigência ficou para trás... ficou.
A educação hoje é quase sinónimo de memorizar, só! No minuto a seguir está esquecida porque automaticamente vêm novos bombardeamentos de informação.
É inevitável não se apanhar com a informação mas com conhecimentos de fundo, sem eles o edifício caí.

9:10 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Ora bem, um post destes não me pode passar como indiferente. Toca-me naquilo que mais gosto, naquilo que me realiza, naquilo que me faz avançar na vida. Vou responder-te dando-te a minha opinião que, como tal, é pessoal. Sou professora do terceiro ciclo. Ensino por paixão. Ensino com a alma. O que criticas é o sistema e, claro está, que este é defeituoso - nada no sistema é perfeito. As políticas educativas foram, são e parece-me que serão sempre relegadas para segundo (décimo...) plano. Muita coisa está errada mas não defendo um regresso ao passado. Nem sequer o segredo está naquilo que defendes, de reinstaurar os exames. Eu sou bastante mais nova que tu e também eu os fiz: recordo-me perfeitamente do exame da segunda classe e enganas-te, afecta uma criança! Eu era a melhor aluna (sempre fui) e chorei baba e ranho de tão nervosa... claro que não morri! Aqui estou! Feliz, concretizada e do lado de cá.
Mas a base do ensino não está no sistema mas sim, como li aqui no comentário de alguém, nos professores. É o professor que rege a sua sala de aula, que deve ver as características dos seus alunos e desenvolver o seu espírito a todos os níveis. E enganas-te se julgas que todos são mentes brilhantes. A alguns já nos devemos dar por muito felizes se os formarmos a nível humano. Se lhes ensinarmos regras de educação. Se lhe transmitirmos valores morais.
Enganaste também se julgas que são superprotegidos nas escolas. Muitos são superprotegidos em casa. Isso sim. Pelos pais. Nas escolas não há superprotecção; há indiferença - porque a educação não está povoada de profissionais dedicados... muitos há que estão lá porque é uma vida "fácil" (para quem não quer saber, é-o de facto).
É o professor que deve mudar o sistema e lutar contra ele no seu pequeno reino, onde é dono e senhor.
E também... deixem-me dizer... que não merecemos (nós que vestimos a camisola) o desprestígio a que temos sido votados.

11:54 da tarde  
Blogger tovarisch Khrushchyov said...

Antes de mais, não sou profe... e andei no outro ensino (antes do 'unificado'). Penso mesmo que apanhei ou o último ou o penúltimo desses comboios (tenho uma irmã com menos um ano que já apanhou o 'unificado'). Concordo plenamente com as várias críticas ao longo deste post e, pessoalmente, penso que o ensino, como tudo, descarrilou um bocadinho ali a seguir aos 'cravos'. Infelizmente até parece que é a geração que 'beneficiou' com as 'passagens administrativas' nos últimos anos da faculdade que nos está a governar agora.

Mas, voltando à educação, penso que o 'problema' foi crescendo, a seguir áquele período conturbado, sem que ninguém tivesse ideias ou autoridade para repôr a educação nos eixos. Pessoalmente lembro-me das ideias 'loucas' de Sottomayor Cardia que me afectaram no fim do Liceu (coisas muito pedagógicas como serviço cívico ou propedêutico).

Mais tarde, era o prof. Aníbal o nosso primeiro, quando fiquei com a nítida sensação que se tomavam medidas administrativas para melhorar artificialmente a 'produtividade oficial' das escolas e dos alunos, que já na altura era muito baixa em comparação com a média dos países que habitualmente nos servem de bitola nestas coisas.

Daí para cá tenho uma péssima opinião sobre a evolução geral da situação da educação no nosso país. Foi começar a ver o pessoal a chegar às universidades com lacunas gravíssimas na preparação base, especialmente em matemática e português, que depois tinham de ser colmatadas no primeiro ano. Por esta altura apareceram as universidades privadas e foi ver o mesmo pessoal a começar a sair depois, do ensino superior, com péssima preparação profissional. Hoje é um problema conseguir arranjar pessoas realmente qualificadas à saída da universidade. Mas estão todos convencidos da importância social, não da profissional, dos seus respectivos canudos. E infelizmente a sociedade, encabeçada pelo próprio estado, fomenta essa atitude. Tenho como excepção a área de medicina, porque quero crer que estamos mínimamente assegurados nesse aspecto.

Cresci com a ideia de que um curso superior é isso mesmo, superior, e que se deve justificar, entre outras coisas, pela sua importância no plano profissional e como tal não deveria ser banalizado. Uma estrutura social produtiva deve conter uns quantos elementos de topo, altamente competentes e escolhidos a dedo, e depois todo um leque de posições intermédias até á base, onde se encontram os elementos mais numerosos, encarregues do que quer que seja que se produz, e que não requerem as qualificações superiores dos que estão no topo da pirâmide, mas sim alta competência técnica, especializada e constantemente reciclada, na área em que operam.

Acredito que possa ser uma visão caduca das coisas, mas o que vejo hoje também não faz sentido. Temos uma sociedade de 'doutores' (i.e. quase tudo 'dê-erres', meros 'Lic.' sem tese e muito menos mestrado) que se acham no direito de ocupar os respectivos 'lugares de topo', a que o seu 'canudo' dá acesso, e depois quase não temos quadros e técnicos especializados de nível intermédio e pessoal de base. Até para o pessoal não qualificado temos de nos socorrer de imigrantes. Parece que há cerca de meio milhão de postos de trabalho que têm de ser supridos dessa forma. Como temos mais ou menos o mesmo número de desempregados, há qualquer coisa que está a falhar a este nível na nossa sociedade.

Pessoalmente acho gravíssimo que há tantos anos se venha descurando, em maior ou menor grau, o ensino em Portugal. Estamos a desvalorizar as habilitações superiores, a produzir pessoas mal qualificadas, que vão ter dificuldades em se adaptar ao mercado de trabalho futuro e que vão sofrer a concorrência directa de gente muito mais qualificada, não só da Europa como, cada vez mais, de qualquer outro local.

E para terminar este já longo 'romance', estou agora mais atento ao que se passa no ensino básico e no secundário, com os quais não tinha tido muito contacto antes (a descendência obriga). Não vale a pena tecer muitos mais comentários, já que nas intervenções anteriores que li o problema foi perfeitamente caracterizado. Só para dizer que, infelizmente, vi-me forçado a ter de adoptar um programa paralelo de reforço e complemento daquilo que o ensino oficial transmite à minha descendência. Sempre fui apologista do ensino oficial, e continuo a sê-lo, mas hoje admito que, se tivesse disponibilidades financeiras para tal, colocava a descendência no ensino particular, num qualquer estabelecimento escolhido a dedo.

Eu não me interessa que os 'meninos' passem, interessa-me que aprendam, e bem.

1:07 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

António, antes de tudo o mais, parabéns pelo teu belíssimo espaço. Venho visitar-te inúmeras vezes, sempre em silencio.
Hoje, deambulava por aqui, e, estive a ler este teu texto.
Vais desculpar-me pelo que te vou dizer, mas, há uma coisa que é por demais preciosa no ensino básico, hoje! E, vou falar-te de cadeira porque, tal como tu, também frequentei uma escola pública, antes do 25 de Abril, em Braga.
Sabes como se fazia a classificação dos miúdos, lá, naquela escola? Eram três filas de carteiras. A da Janela era a dos Espertos, a do Meio a dos Mais ou Menos e a da Porta a dos Burros.
Nem sequer preciso explicar-te a razão desta ignóbil classificação, pois não?
Acredita que, cada vez que penso no que vivemos (eu e todas as colegas) porque a classe era só de raparigas, fico completamente arrepiada.
Vou contar-te um episódio que nos marcou a todas, até hoje.
A fila dos burros, no caso, das burras, era um bombo de festa!
Havia uma colega que não conseguia decorar as linhas de caminho de ferro. (Ainda hoje me pergunto o pq de ter de saber de cor o percurso dos caminhos de ferro, Deus meu!...)
Ora, a nossa professora, todos os dias a chamava ao estrado, a voltava para o mapa e, de menina dos 5 olhos na mão, perguntava-lhe o percurso de uma linha de comboio qualquer.
A minha colega ficava em silencio. Estendia a mão e caía a primeira palmada.
E, era ver, António, uma menina a ser sovada, a não verter uma lágrima que fosse, e, todas nós, tão miúdas quanto ela, tão ignorantes quanto ela, a assistirmos a tudo aquilo.
Silencio, palmada, silencio, palmada, silencio, palmada...
Chegou a um ponto, a professora, completamente desvairada, porque a colega não chorava, não falava, que, aos gritos, sai da sala...
Ficámos aterradas, mas, ai de nós, se fizessemos ou dissessemos fosse o que fosse!
Momentos depois, ela volta, acompanhada do marido, que era também professor, mas da ala dos rapazes, no andar de cima.
Nunca mais nenhuma de nós se esqueceu do que aconteceu, então.
"-Bate-me nessa miúda porque eu não sou capaz de a por a chorar!"
António, por favor não digas que há falta de respeito, que tratam os nossos filhos como se fossem bibelots. Não digas!
Imagina-te garoto, na tua secretária a ver um homem horrendo de grande, de enorme, a bater, a sovar, uma garota de 8 anos... Imagina-te a ver a tua colega a cair no estrado, a chorar, a implorar que não lhe batesse mais.
Imagina-te, António, e, vais entender porque é que eu olho hoje para as minhas duas filhas, e, respiro fundo, e sorrio-me toda, porque não há terror, não há febres repentinas, não há voltar a fazer xixi na cama todas as noites.
A culpa, António, não é do tipo de ensino.
A culpa do insucesso, passa, antes de tudo o mais, pelas pessoas, e, que me perdoem todos os professores.
Haja empenho, e, vais ver como este ensino funciona.
Desculpa este desabafo, mas não consegui ficar calada.
Pelo teu espaço, pelos teus contos, sejam eles ficção, retirados do teu dia a dia, os meus mais sinceros parabéns.
Cristina Miranda

12:50 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Parabéns, Cristina, pela forma como contaste esse episódio de sadismo bem comum nas escolas de há uns anos atrás.
Felicito o António também pelas suas histórias, bem contadas.
Mas torna-se relativamente óbvio que ele tem um especial prazer em falar deste tema. Pode até ser parafilia.
Ao falar desta forma, o António com certeza queria recolher comentários. No silêncio da sua casa, frente ao computador, pode deliciar-se com casos contados por outras pessoas e com opiniões de outros cibernautas.
É algo doentio.

9:44 da tarde  

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