Eu sou louco!

Irreverência, humor, criatividade, non-sense, ousadia, experimentalismo. Mas tudo pode aparecer aqui. E as coisas sérias também. O futuro dirá se valeu a pena...ou melhor seria ter estado quietinho, preso por uma camisa de forças! (este blog está registado sob o nº 7675/2005 na IGAC - Inspecção Geral das Actividades Culturais)

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domingo, fevereiro 26, 2006

O viúvo - parte XX e última

- Acabaram de telefonar do lar de Santo Tirso a dizer que a D. Josefina faleceu há meia hora com um derrame cerebral.
- Pobre senhora! Se calhar foi melhor assim. Pelo que dizias, já estava mais para lá do que para cá.
- É isso! Agora vamos ter de alterar os nossos planos – disse ele.
E continuou:
- É melhor hoje dares uma arranjadela mais rápida a esta casa para depois passarmos pela tua porque tens de te compor para ires comigo a Santo Tirso. O funeral vai ser certamente amanhã e, embora eles tratem de quasi tudo, tenho de acompanhar as coisas. Quando chegarmos, vamos novamente a tua casa.
- Isto é que está a ser um dia! Safa! – e até a Rosa respirava fundo.
- Enfim! É a vida! Depois vamos ter muito tempo para descansar – resignou-se o homem – vou dizer do passamento ao João.
- E amanhã vamos juntos ao funeral? – perguntou ela.
- Pois! Ah! Já percebi onde queres chegar! Olha que raio! Digo já ao João que estás a viver comigo e pronto! – despachou o homem.
- Se calhar é melhor eu não ir ao funeral – disse ela.
- Vais, sim senhora! Ela já não tem família nenhuma, acho que deves ir. Além disso, conhecia-la bem!
- Pronto! Então vou! Mas avisa o Sr. Pinto da nossa situação, senão eles ainda tem um fanico – e a mulher riu-se.
- Vou telefonar enquanto tratas da arrumação – disse ele.

Esse dia e o seguinte, terça-feira, foram por demais agitados.
Finalmente, na quarta-feira, ficaram até mais tarde na cama.
Amaram-se e preguiçaram.
Parecia que iriam ter um primeiro dia sossegado, como casal em coabitação.
Levantaram-se por volta das dez e meia.
Depois dos banhos e do pequeno-almoço, ela ficou a tratar da casa mas também a fazer o almoço para ambos e ele foi fazer as compras e tudo o mais que era habitual.
Regressou a casa por volta da meia hora.
Ía a entrar no prédio quando ouviu uma voz:
- Bom dia, papá!
Voltou-se e encarou com a Cris, sedutora e provocante como sempre.
- Olá! Estás com um óptimo aspecto – disse ele.
- Tu também!
Entraram para o átrio e ele falou-lhe mais baixinho:
- Vou-te dar uma novidade! Ou melhor, duas. A minha sogra faleceu e o funeral foi ontem.
- Lamento! – disse ela.
- Mas a mais importante é a segunda: a minha ex-empregada Rosa está a viver comigo.
- A sério? – admirou-se a vizinha.
E continuou:
- De facto, pensando melhor, acho que é um desfecho normal e que já me tinha passado pela cabeça. Mas foi tudo muito rápido, embora também nesse aspecto eu sei bem como tu ansiavas uma companhia permanente. Mas tu ama-la?
- Amar, não! Mas gosto dela e acho que ela gosta de mim...
- Ou está interessada na vida que lhe podes proporcionar! Mas desculpa! Eu às vezes não tenho tento na língua – desabafou a morena.
- E pensas que eu não sei isso? Mas se ela for uma boa companheira, se nos entendermos bem, podemos ser felizes. Sabes que o óptimo é inimigo do bom – disse o Zé.
- Mas vais casar ou já casaste? – perguntou a Cristina.
- Não! Vamos viver juntos, só! Mas vou fazer-lhe o testamento.
Ela pensou durante uns instantes e sentenciou.
- Acho que fizeste bem! Tu és esperto, meu velhote querido! – e riu-se, enquanto lhe dava um fugaz beijo nos lábios.
Ele sentiu um arrepio a percorrer-lhe a espinha, mas não se desmanchou.
- Acho que, neste caso, estou a defender os meus interesses mas também os da Rosa. E tenho para com ela uma grande dívida de gratidão – confessou ele.
- E tencionas ser papá? – perguntou a mulher.
- Não! Mas nunca se sabe! Ela só tem quarenta anos. Eu é que já vou fazer cinquenta e nove. Se fosse pai aos sessenta, com setenta tinha um filho com dez anos. Acho que é muito tarde – ponderou o Novais.
- Aposto em como vais ser pai! A Rosa vai engravidar para garantir que não a trocas. Por mim, por exemplo! – e riu-se.
- Olha que tu és levada da breca! Mas também te digo que se ela engravidasse e quisesse ter um filho eu não me oporia. Já que não pude ter um da minha querida Margarida...
- Meu ancião leviano, acho que por hoje chega de conversa – despediu-se ela – somos vizinhos e havemos de nos encontrar muitas vezes.
- Mas tem juízo e porta-te bem! – disse ele, sorrindo.
- Podemos subir juntos no elevador? – gozou ela.
- Claro! Mais cedo ou mais tarde vais conhecer melhor a Rosa e falar com ela. Também é tua vizinha – respondeu o homem.
- Olha, Zé! Desejo sinceramente que sejas muito feliz. E se nascer um Zézinho ou uma Rosinha não te esqueças de me convidar para madrinha – e riu-se novamente.
- Depois veremos! Boa sorte para ti, também!
E, já no piso de destino, cada qual foi para o seu apartamento, depois de se despedirem com dois beijos na face.
O Zé Novais entrou em casa.
- Ainda bem que te atrasaste um bocadinho. Só agora o almoço está quasi pronto – disse a companheira.
- Estive a falar lá em baixo com a tua inimiga que mora aqui ao lado – disse ele, jogando habilmente com a verdade.
- Ah! E quando me contas as tais coisas muito secretas? – aproveitou ela para perguntar.
- Quando for oportuno. Não te amofines que não tem implicações contigo.
- Pronto, Zé! Prometo não falar mais no assunto – disse ela.
- Linda menina! Mas que bem cheira a comidinha! – gabou ele.
- Não fiz nada de especial. Mas vais poder avaliar como eu sou boa cozinheira. Vais ter de ir todos os dias ao ginásio senão começas a engordar – disse a mulher, dando uma risada.
- Vamos combinar uma coisa. Tu fazes comida saborosa mas em pouca quantidade, está bem? Olha que não quero que engordes, ouviste? Estás muito bem assim – estipulou o Zé Novais.

Hoje é dia 26 de Fevereiro de 2006.
E a Rosa engordou.
Está grávida de três meses.

sábado, fevereiro 25, 2006

O viúvo - parte XIX

Segunda-feira, vigésimo quarto dia do mês de Outubro de 2005.
- Bom dia, senhor Novais! – disse a Rosa enquanto entrava no apartamento do Zé Novais.
- Bom dia, Rosa! Hoje vens mais agasalhadinha – respondeu o patrão.
- Pois! O tempo ontem arrefeceu. É o Outono a entrar a sério – disse ela.
- Eu já tomei o pequeno-almoço e estava à tua espera – informou o viúvo.
- Ah! É por causa da lista. Eu dou-lha já! – e a empregada apressou-se a ir buscar o papel e dá-lo ao José.
- Não! Não era por causa disso! É por um assunto muito mais sério – disse, com um ar muito formal, o homem. Anda aqui para a sala e senta-te por favor.
- Com certeza! – e a Rosa teve um pressentimento que lhe fez o coração bater mais apressadamente.
Instalados, o Zé começou:
- Olha, Rosa! Como sabes, desde que a minha mulher morreu que me sinto muito só aqui em casa. Tens sido tu quem me tem valido, e em várias perspectivas. Agora não vou dizer nada do que se passou aqui com a vizinha, nem isso interessa muito para o caso. O importante é que não é ela que vem viver comigo. Está decidido. Eu queria que fosses tu, Rosa, a vir viver cá para casa. Mas...
Não concluiu o discurso porque a mulher irrompeu num choro bem molhado e bem fungado.
O homem calou-se e esperou que a Rosa serenasse.
- Mas... – ía continuar, no entanto ela interrompeu-o:
- O Sr. Novais nem sabe como me está a fazer feliz. Acho que nunca me senti tão bem na minha vida como neste momento.
Levantou-se e foi beijar o Novais nas faces, e depois suavemente e com muita ternura, nos lábios. Sentou-se de novo.
- Mas, como eu ía dizendo, por enquanto não tenho intenção de casar contigo.
- Não é isso que me importa! É poder estar com o senhor e tratar de si – interrompeu a mulher – e também não me posso casar porque ainda o sou com o António.
- Mas deixa-me acabar! – disse ele – há uma razão para esta decisão. É que eu tenho direito a uma pensão que é metade da reforma da minha mulher mas, se me casar de novo, perco o direito a ela e como espero que tu deixes de trabalhar, não quero prescindir desse dinheiro. Além disso, tenciono dar contigo vários passeios, quer no país quer no estrangeiro e alguns dos locais a visitar não serão nada baratos.
- O senhor já reparou....
Agora foi a vez dele a interromper:
- Olha Rosa! A partir deste momento vais tratar-me por tu. E por José ou Zé, ou Zé Luís, como quiseres.
- Isso vai ser um bocado difícil!
- Ora! Ora! Há coisas muito mais complicadas. Ter de arranjar uma nova empregada, por exemplo.
- Uma empregada? Mas eu a viver aqui todo o tempo não preciso de empregada! – admirou-se ela.
- Pois! Talvez! Olha! Tu és a dona da casa; tu é que sabes.
- Mas tenho compromissos com a D. Emília. Todas as manhãs, quando saio daqui vou lá a casa dela e também nas tardes em que não venho para cá – lembrou a Rosa.
- Tens razão! Não me lembrei disso, que chatice! – praguejou o homem – quantos dias mais é que vais ter de lá ir?
Ela ficou pensativa durante uns momentos e disse:
- Vou primeiro falar com uma vizinha minha, uma mocita de vinte e poucos anos que ficou agora desempregada, e depois vou falar com a D. Emília e levo a Andreia comigo. Pode ser que a coisa se resolva já hoje. O pior é que ainda não fiz nada aqui e já são quasi dez horas.
- Deixa lá esta casa agora. Eu levo-te à tal Andreia, falas com ela, e depois trago-te aqui à senhora. Ela mora no prédio de baixo, não é? – alvitrou o Zé.
E completou:
- Entretanto passamos pela tua casa e trazemos as coisas essenciais. Logo que possamos vamos buscar o resto.
- Por mim está bem! – anuiu a nova companheira do Novais.
Pouco depois estavam no veículo.
- Curioso! Levei as roupas da D. Guida embora e agora trago-as de novo para os mesmos sítios – lembrou a mulher.
- É! Não me tinha ocorrido isso! Só prova que és a mulher indicada para mim – e fez-lhe um sorriso aberto ao qual ela correspondeu.
- Sabes que sou mais velho do que tu e não tenho herdeiros directos. Há o meu irmão e os meus sobrinhos mas estão bem arrumados. Portanto, embora não nos casemos, vou fazer um testamento a teu favor. Se eu morrer primeiro, o que é o mais provável porque tenho mais dezoito anos do que tu, ficas bem.
- Como me sinto feliz, Zé – disse ela – gostas que te trate assim?
- Está bem! Como quiseres...
- Como sou feliz, meu amor! Como sou feliz! Podes ter a certeza que nunca te vais arrepender de me ter escolhido – prometeu a nova dona da casa.
- É isso que espero, Rosa! E se não tivesse a certeza de que tu serias a companheira ideal para mim nesta fase da vida, não te teria convidado para vires viver comigo e partilharmos as coisas boas e más que a vida nos reserva – dissertou o Novais.
E continuou:
- Como é com a tua casa? Esta alugada por um baixo preço. Lembro-me de a Guida me ter falado nisso. Como o contrato de arrendamento deve estar no nome do António, o melhor é falar com o advogado para ele dar um conselho.
- Pois é! Mas eu estive lá há dias. Achas que tenho de marcar uma nova consulta? – perguntou a mulher.
- Deixa estar! Eu telefono-lhe – optou o José Luís.
E pararam em frente da casa da Rosa Maria Santana, assim se chamava ela.
Os olhares da vizinhança, com maior ou menor discrição, focalizaram-se no casal. Algumas cortinas entreabriram-se.
- Vai então falar com a moça e trazer as tuas coisas básicas. Eu vou fazer as compras e venho daqui a um quarto de hora, mais coisa menos coisa.
Quando o Novais regressou já a Rosa estava à porta com uma pequena mala e um saco e tinha a seu lado uma rapariga alta, magra, de longos cabelos de um loiro visivelmente químico, uns jeans e uma camisola. O Zé olhou-a e comentou para consigo:
- É jeitosa, a moçoila!
Depois de tudo acomodado, lá seguiram para casa do José.
Este levou a bagagem para o apartamento enquanto as duas mulheres se dirigiram para casa da sexagenária senhora.
Passavam uns trinta minutos das onze quando a porta se abriu.
- Então, Rosa?
- Está tudo tratado! Já acertei as contas com a D. Emília e a rapariga já lá ficou a tratar das coisas.
- Já viste que hoje tudo está a andar a um ritmo alucinante? – fez notar o viúvo.
- Quando tem de ser, tem de ser – respondeu a mulher.
- Vamos almoçar fora? – sugeriu o Zé.
- Agora é melhor eu arrumar a casa. Não quero que a minha casa – e acentuou bem as duas últimas palavras – esteja desarrumada.
- Está bem! – concordou o homem.
Mas disse mais, enquanto ía acompanhando o percurso da companheira.
- Depois vamos almoçar fora, os dois, e ainda a casa do João e da Mina dar-lhes a novidade. Antes de regressarmos aqui vamos buscar mais coisas tuas. Já que estamos em ritmo supersónico, continuamos.
E continuou:
- Como a Margarida faleceu há pouco tempo, não te vou apresentar como minha mulher às pessoas em geral. Daqui a uns meses, passarei a fazê-lo. Para já vais ser minha amiga – e riu-se, o Zé.
- Por acaso até concordo – respondeu ela.
Tocou o telefone.
O Zé foi atender.
O seu semblante ficou carregado, fez algumas perguntas e ouviu atentamente o que lhe diziam.
Finalmente desligou.
- Oh Rosa! Anda cá, por favor! – chamou alto.
Ela entrou na sala e viu-o de pé com um ar aéreo.
- Que foi? – perguntou a mulher.

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

O viúvo - parte XVIII

- Negativo! – disse ele com um tom de voz que não escondia a satisfação – que alívio, Cristina! Não saberia bem como lidar com uma filha e com o incesto, ao mesmo tempo.
- Que bom, Zé! Que bom! – desafabou a mulher – comigo também se passava o mesmo.
E baixinho para que ninguém, por perto, ouvisse:
- Um novo pai que era o meu amante. Que situação complicada!
- Sabes que até chorei? – disse ele.
- Pois! E eu estou com as lágrimas nos olhos – revelou a morena – agora vou telefonar à minha mãe. Queres ir almoçar comigo?
- Está bem! Eu passo por aí à meia hora.
- Está combinado! Até já! – despediu-se a vizinha.
Logo de imediato a Cris ligou para o telemóvel da mãe.
- Mãe? Tenho boas novidades para ti.
- Virgem Santíssima! O teu pai é mesmo o teu pai, é isso? – perguntou, ainda angustiada, esquecendo-se que havia pessoas por perto.
- É isso mesmo! O teste deu negativo! Foi um alívio para os três – disse a filha.
Do outro lado não ouviu palavras mas só um choro soluçado que a deixou sossegada. Era a mãe a libertar-se finalmente do peso que trouxera no coração, talvez fosse melhor dizer na consciência, durante tantos anos.
Também a filha não resistiu e começou a chorar para espanto da Maria Helena que continuava completamente à margem do que se passava.
- Estás bem, Cristina? – perguntou.
A amiga e empregada limitou-se a um sorriso molhado com lágrimas e a um abano de afirmação com a cabeça.
Passado mais de um minuto a filha chamou a mãe:
- Oh mãe! Já pode falar? Está bem?
- Sim! Sim! Sim! Está toda a gente a olhar para mim...que vergonha! – disse a mais velha das duas.
- Deixa lá! Eu também já estive aqui a chorar – confessou-lhe a Cris.
E continuou:
- Olha, mãe! Eu vou almoçar com o Zé Luís e logo passo por aí às oito e vamos as duas jantar fora, valeu? Põe-te bonita!
- Está bem, filha! Tu reagiste muito serenamente quando te dei a novidade. Agora mostraste que também estavas sob tensão.
- Pois é, mãe! Às vezes temos de esconder o que nos vai cá dentro. Mas em algum momento há a explosão. Acho que renascemos os três – filosofou a filha – então até logo. Um beijo muito grande!
- E para ti também!
E desligaram.

Pouco depois, já era quasi meio-dia e meia hora, ouviu-se um buzinar no exterior. Lá estava o 307 do Novais.
- Maria Helena! Eu vou sair agora, está bem? – pediu a Cris.
- Está na hora! Bom apetite e que a companhia seja boa – respondeu a Lena sem conseguir evitar lançar uma farpa para ver se a amiga se abria alguma coisa; mas só conseguiu um:
- Então, até logo!
E um beijo.
Quando a Cris entrou na viatura agarrou-se ao Zé, beijou-o suavemente nos lábios, encostou a cabeça no peito do homem e recomeçou a chorar.
- Chora, Cris, chora! Faz-te bem aliviar a tensão acumulada.
Colocou-lhe a mão por cima e também ele verteu algumas lágrimas.
- Não arranques já, Zé! Deixa-me normalizar, está bem? – pediu ela.
- Está bem! Eu também chorei no caminho para cá. Até me ía despistando na Via Norte...
- Sabes que não tenho vontade nenhuma de comer? Acho que vou para casa – disse a morena.
- Nem eu! – disse o Zé.
- Então vamos para minha casa e lá enganamos o estômago. Não te admires se não falar muito, mas ainda estou emocionada. Não fazes ideia do que foi este mês para mim. Eu e a minha mãe valemo-nos uma à outra. Mas nunca lhe disse que tínhamos tido relações, evidentemente – falou a Cristina.
- Já posso arrancar?
- Já! – disse ela, e sentou-se correctamente no banco, colocando também o cinto de segurança. Olhou para o espelho e limpou a cara:
- Como estou horrorosa!
- Tu nunca podes estar horrorosa – galanteou o Zé.
Pouco depois estavam em casa dela.
Pouco falaram durante os primeiros minutos.
- Ah! E a tua mãe como reagiu ao saber da novidade? – perguntou ele.
- Esteve uns minutos a chorar. Imagina o que é ter um segredo destes guardado no peito durante trinta e cinco anos! Logo vamos as duas jantar fora.
- Fazeis bem! – apoiou o quinquagenário.
- Sabes, Zé! – disse ela – acho que nos próximos tempos não vou querer ter contactos íntimos contigo. Acredites ou não, depois do que se passou olho para ti como uma espécie de pai. Possivelmente isto será ultrapassado mas só o futuro o dirá.
- Eu também te vejo com outros olhos. Exactamente como uma espécie de filha. Acho que o que passamos durante este mês deixou sulcos muito profundos em nós. Estou totalmente de acordo contigo. Mas acho que vamos ter uma belíssima amizade. E gostaria de estar com a tua mãe.
- Estamos em consonância. Eu vou tentar realizar o tal jantar a três que ficou em suspenso, lembras-te? – perguntou ela.
Mas não esperou pela resposta:
- Vamos lá ver se não tenho de me esforçar um bocadinho para convencer a minha mãe.
- Eu compreendo se a Laura não me quiser ver – disse o Novais – acho mesmo que não lhe fará bem estar comigo, pelo menos nos tempos mais próximos.
- Tens razão, velhote – e riu-se, a mulher – nem lhe vou falar no assunto.
- Então está combinado! Amigos e não amantes! – resumiu o José Novais – e deixemos que o futuro decida por nós.
E depois de comerem muito frugalmente, ela voltou à agência e ele foi para casa.
Não passou muito tempo e o Zé Novais, que sentia há muito necessidade de desabafar, telefonou ao amigo João e disse-lhe:
- Meu velho! Tenho uma história do arco-da-velha para te contar. Mas é só a ti. Depois, se quiseres, podes dizê-la à tua mulher. Portanto amanhã vamos fazer a nossa bilharada e convido-te desde já para depois irmos almoçar os dois a um restaurante. Talvez àquele da Leonesa. Ao sábado deve ter pouca gente e podemos falar à vontade.
- Agora deixaste-me em pulgas. Tu, de facto, tens andado um bocado em baixo. Mas quando eu te perguntava o que se passava tu dizias que estava tudo bem...mas aceito o convite, evidentemente – confirmou o João Manuel Pinto.

No sábado encontraram-se e, perante o espanto do amigo, o José Luís Novais contou-lhe tudo o que acontecera desde que a Maria Cristina fora viver para o apartamento vizinho.
- Olha que nem sei se fale nisto à Mina. Ela não é muito puritana, mas a história mais parece um romance do Eça – comentou, em certo momento, o mais velho.
- Faz como quiseres! Mas não fales nisto a mais ninguém – recomendou o homem mais novo.
- E a Rosa? – quis saber o João.
- Bom! Essa é outra história! Fica para outro almoço – e riu-se.
Terminada a refeição, que demorou bastante tempo, foram dar uma volta a pé.
- Não vou hoje a Santo Tirso. Tinha essa ideia mas já é um pouco tarde. Vou amanhã.
- Sabes que noutro dia fui lá com a Mina? – revelou, questionando, o amigo de S. Mamede – acho que não vai durar muito. Estava a dormitar e ficamos lá pouco tempo. Acho que já anda por cá a fazer muito pouco.
- Isso é verdade! Mas, como sabes, além de ser a mãe da Guida, eu gostava muito dela e é-me sempre difícil lá ir vê-la. Mas não a quero deixar morrer sozinha. Faço-o por obrigação mas também por dedicação – disse o Zé.
- Tu és um tipo porreiro! Olha que qualquer outro já se tinha esquecido da senhora e ficava a aguardar um telefonema a dizer que morrera.
- Sim! Mas eu tenho tempo para a acompanhar o melhor possível.
E conversaram sobre outros assuntos mais. Já passava das quatro e meia quando se despediram.

terça-feira, fevereiro 21, 2006

O viúvo - parte XVII

Finalmente ouviu uma respiração suave. O coração acalmou.
Pelo menos respirava, o patrão.
A Rosa retirou-se do quarto e encostou mais a porta para que os ruídos que fazia não perturbassem o sono do Novais.
Só quando eram quasi dez horas, ouviu:
- Rosa! Oh Rosa!
Dirigiu-se imediatamente para os aposentos do José e, juntinho à porta, perguntou:
- Precisa de alguma coisa, senhor Novais?
- Oh Rosa! Desculpe-me, mas não se importa de me abrir a persiana?
A mulher entrou no quarto e disse:
- Bom dia! Posso acender a luz? Senão ainda me esbarro com alguma coisa.
- Claro! Acenda a luz. Bom dia! – e seguiu com os olhos a mulher a passar aos pés da sua cama e dirigindo-se à janela.
- Chega assim. Está bem. Agora pode apagar a luz, por favor – orientou a manobra, o Zé.
- O senhor está bem? Dormiu mais do que o costume – disse a empregada.
- Mais ou menos. Mas passei uma noite má. Senti-me mal do estômago e dormi pouco. Mas agora sinto-me melhor. Que horas são? – disse, enquanto levantava a cabeça para ver as horas – dez e cinco. Não me apetece nada levantar.
- O senhor Novais quer que eu lhe faça um chã? – perguntou a Rosa.
- Faz-me esse favor? Que bom! Já não sou apaparicado há tanto tempo – disse, satisfeito, o homem.
- E umas bolachinhas de água e sal? Ou outras? – perguntou maternalmente a mulher.
- Pode trazer-me umas bolachas Maria – indicou o viúvo.
Passado pouco tempo a mulher voltou com um bule, uma chávena e o pires respectivo, uma colher e ainda um prato com algumas bolachas. Não esquecera um guardanapo.
Ao ver aquilo, o Novais não pôde deixar de exclamar:
- Hoje até me sinto um rei! Até já estou bom! E o serviço de chã...há quanto tempo não o via...
- Eu sei onde estão todas as coisas nesta casa – vangloriou-se a Rosa.
- Pois! Não me admira! Há vários meses que você é a verdadeira dona da casa – disse o Zé deixando a mulher satisfeita.
Ele sentou-se na cama, arranjou a travesseira nas costas e pediu:
- Então dê-me o tabuleiro, por favor.
A mulher, novamente bem perfumada, com a saia curta e uma blusa bem decotada, como ela gostava de usar para chamar a atenção do patrão, entregou-lhe o tabuleiro de madeira adornado com um naperon.
- Hoje estou um pouco em baixo. Oh Rosa, sente-se aí na cama e faça-me um pouco de companhia – pediu, maliciosamente, o Zé.
- Se precisa de companhia não posso dizer que não – respondeu a Rosa enquanto se sentava ao fundo da cama, do lado em que estava o homem, com um pé no chão e a outra perna dobrada e pousada na cama.
Nesta posição, o Zé podia ver as coxas da mulher até uma zona bem subida. Naturalmente que deixou de ter vontade de comer as bolachas Maria mas de, em vez disso, comer a Rosa.
- Oh Rosa! Quer umas bolachinhas, também? – perguntou.
- Não, obrigado! – foi a resposta.
- O seu decote hoje ainda é mais bonito – gabou o homem – mas para falar francamente, eu gosto mesmo é dos seus seios.
O Zé estava a ficar sem controlo.
Ela sorriu e nada disse.
- Ora porra! Entornei o chã – exclamou o Zé, usando um truque inspirado no episódio do café, ocorrido algum tempo antes.
- Não se preocupe! Eu vou buscar uma toalha e limpa-se já! – disse ela.
Durante a curta ausência, o Zé poisou o tabuleiro e todos os objectos que ele suportava do outro lado da cama e aguardou.
A mulher chegou de imediato e, debruçada sobre o patrão, começou a limpar-lhe o casaco do pijama.
- Tenho o peito molhado – disse ele.
E começou a desabotoar o fino casaco do pijama.
- Limpe aqui, Rosa, por favor – e apontava para o peito nu, recoberto de uma almofada de pêlos grisalhos.
Ela assim fez.
O homem, então, sem dizer palavra, segurou na cabeça da empregada e aproximou-a da dele. Não houve qualquer resistência, como ele esperava.
Era o sinal de que o caminho estava livre.
Beijou-lhe os lábios. Ela largou a toalha e estendeu-se sobre o corpo do patrão enquanto o beijava com sofreguidão.
As mãos do homem levantaram a saia da Rosa e apertaram as nádegas, duras. Deslocou as mãos para as costas dela, abraçou-a e rolaram juntos para o interior da cama. O tabuleiro caiu e tudo e que estava nele pousado.
- Deixa estar isso no chão, Rosa!
Agora sobre ela, desabotoou-lhe a blusa e tirou-lha, desapertou o soutien e segurou com força ambas as apetitosas mamas.
- Deixa-te estar deitada, Rosa! – ordenou.
Levantou-se um pouco, tirou o casaco do pijama, depois as calças, depois a saia da mulher e começou a acariciar a zona púbica dela, ao mesmo tempo que roçava o falo nas pernas da mulher que estava com os olhos fechados e soltava gemidos de prazer. As carícias não duraram muito tempo. Enquanto lhe beijava os seios deitou-se sobre ela e colocou o membro, em estado verdadeiramente viril, junto da zona vaginal já totalmente humedecida. Ela abriu as pernas e, de forma suave, o Zé penetrou-a totalmente.
Pouco depois a Rosa já gritava e o Zé bombeava cada vez mais, e mais, e mais, e...lançou um grito gutural para logo se deixar cair, qual corpo morto, sobre a mulher.
Ela, de olhos sempre fechados, tinha um sorriso nos lábios que pareciam querer dizer:
- Agora és meu!
Ele rolou para o lado e deixou-se ficar lado a lado com a empregada.
Finalmente, esta rompeu o silêncio:
- Senhor Novais! Vou-me lavar e depois tenho de arrumar a casa.
- Está bem! Mas dá-me um beijinho antes – pediu o homem.
Beijaram-se e ela levantou-se.
O Zé ficou na cama, pensativo:
- Para já não vou dar passos grandes. Só pequeninos. Ela hoje está cá de tarde. É boa altura para falar com ela.
O resto da manhã decorreu como se nada se tivesse passado. Quando o Zé estava pronto, disse:
- Rosa! Eu logo de tarde falo consigo, está bem? Agora vou almoçar.
- Sim, senhor Novais – aceitou ela, e pensou:
- Agora, com calminha, ele vai ser meu. Só meu. Não escapa!
Passava pouco das duas e meia quando o Zé reentrou em casa. Dirigiu-se para a sala e sentou-se no seu sofá predilecto.
- Oh Rosa! Venha cá, por favor – chamou.
Ela apareceu quasi de imediato.
- Não se partiu nenhuma peça do serviço, pois não? – perguntou.
- Partiu-se a asa do bule. Mas acho que, se for bem colada, mal se vai ficar a notar – disse ela.
- Que chatice! Um serviço tão bom! Olhe, Rosa! Mas o que eu lhe queria dizer era o seguinte: eu pensei em convidá-la a vir viver comigo.
Os olhos da mulher brilharam mais que diamantes.
Mas ele continuou.
- Mas antes do dia vinte e um não quero tomar decisões desse tipo. Depois, veremos. Para já só lhe queria perguntar se está disposta a vir dormir comigo nas noites das segundas e quintas, por exemplo.
Ela ficou pensativa, por instantes, mas depressa respondeu:
- Sim, senhor Novais!
- Obrigado, Rosa! Não se vai arrepender – rematou ele.
O resto dessa semana e a seguinte decorreram quasi que com a normalidade habitual:
A novidade era que o Zé, nos dias combinados, ía buscar a empregada a casa dela depois do jantar, conversavam um pouco, e cerca das onze horas íam para a cama. Uma vez o Zé estava mais entusiasmado e tiveram relações no sofá grande da sala. Na manhã seguinte ela fazia os trabalhos como habitualmente e depois saía.

Finalmente chegou o dia vinte e um de Outubro.
Na véspera, o Zé telefonara para a Cristina e perguntara-lhe se ela queria ir com ele buscar os resultados.
A resposta, que já estava pensada, foi negativa:
- Não quero faltar mais ao trabalho. Só te peço que me telefones logo que saibas o resultado.
Ela não queria enfrentar o possível pai biológico mesmo no momento da revelação. Assim teria algum tempo para digerir a informação sobre o resultado do teste.
- Naturalmente! Será a primeira coisa que farei – retorquiu ele.
E ao fim da manhã da sexta-feira tão esperada, estava a morena na agência de viagens quando tocou o telefone:
- Já vi que és tu. Então? Qual foi o resultado? – perguntou, ansiosamente, a Cristina.

domingo, fevereiro 19, 2006

O viúvo - parte XVI

Dia vinte e um de Setembro, quarta-feira.
José Novais e Maria Cristina foram ao Instituto de Genética fazer os testes de ADN para saberem ao certo se eram ou não pai e filha. Estavam nervosos. Falaram pouco.
Quando vieram embora, menos de meia hora depois, já sabiam em que dia se saberia a verdade: no dia vinte e um de Outubro, uma sexta-feira.
No regresso, o silêncio foi ainda maior. Zé ligou o auto-rádio para dar um tom menos escuro à viagem. Mesmo sendo dia de sol, dentro do carro o ambiente era sombrio.
Chegados à Maia, Zé deixou a vizinha à porta da agência. Ela deu-lhe um beijo e agradeceu. Maria Helena, involuntariamente, presencia tudo e pensou:
- Mas que confiança! Esta mulher nunca mais ganha juízo. Que se passará?
O Zé arrancou e foi para casa. Só queria ver se estava tudo bem. Depois seguiria para o lar a fim de ver a sogra que continuava muito limitada e a definhar lentamente. A morte da filha fora um sopapo muito grande. Sem mais filhos, nem netos, nem irmãos, sentia como nunca que era o último elo de uma cadeia que brevemente chegaria ao fim.
Entretanto o José abriu a porta de casa.
Ouviu o barulho de um aspirador no quarto e dirigiu-se para lá.
- Bom dia, Rosa! – saudou.
- Bom dia, senhor Novais! Bons olhos o vejam! Hoje madrugou! – disse a mulher com um tom jovial depois de desligar a máquina.
- É verdade! Tive de tratar dum assunto. Olhe! Há compras a fazer? Se houver dê-me a lista que eu daqui a pouco vou ao lar ver a minha sogra.
- Há, sim senhor! Eu vou buscá-la – e dirigiu-se para a cozinha.
O Zé seguiu-a e não pode deixar de apreciar as pernas bem torneadas e os dois esses, bem desenhados, dos contornos do tronco da empregada.
- Aqui está! É pouca coisa – disse ela.
O patrão deu uma olhadela e confirmou:
- Ainda compro isto antes de ir para Santo Tirso. Até amanhã, Rosa! Desculpe estar pouco falador mas não tenho grande disposição para conversas.
- Até amanhã, senhor Novais! – despediu-se a mulher.
E pensou:
- Humm...parece-me que o romance está a acabar. Foi rápido. Tenho de consolar o desgraçado – e riu-se sozinha.

Na manhã do dia seguinte, quando a Rosa chegou já o patrão estava a preparar o pequeno-almoço.
- Bom dia, senhor Novais!
- Bom dia, Rosa! – respondeu ele.
Sentiu um agradável cheiro a perfume, o que não era habitual, por isso comentou:
- Mas que bem cheira a Rosa, hoje! Assim é que parece mesmo uma flor.
E olhou para a mulher.
A Rosa estava particularmente apetitosa, com uma saia larga e curta e uma blusa branca, florida, com um decote bem aberto.
- Essa blusa era da minha mulher, não era? – perguntou.
- Era, sim! É muito bonita. Sempre gostei muito dela, talvez porque ficava muito bem à senhora – respondeu a empregada.
- Pois também lhe fica muito bem. E o decote tem um bom corte – não resistiu o Zé a comentar.
- Muito obrigado!
- Sabe que quando olho para si me lembro da minha mulher? – disse o viúvo.
- Nós éramos muito parecidas fisicamente – confirmou a empregada.
- Sim! Sem dúvida! Mas a Rosa é mais morena e tem o cabelo castanho e ondulado. A Guida era mais branca e aloirada. E os olhos: os dela azuis e os seus....deixe ver! – insinuou-se o homem.
Rosa voltou-se para ele
.
O Novais aproximou-se dela, olhou-a nos olhos, segurou-lhe o queixo para orientar o rosto de modo a receber luz directa e disse:
- Castanhos. Mas castanho escuro. Nunca tinha observado bem, por isso não sabia se eram mesmo pretos ou castanhos. E são bonitos. Aliás, você é uma mulher bonita – galanteou o homem.
A mulher corou ligeiramente, sorriu e disse:
- Muito obrigado!
- Não agradeça. As verdades não se agradecem – atirou o Zé.
A mulher estava derretida com os elogios do patrão, mas retorquiu:
- Eu agradeço sempre as coisas bonitas que me dizem.
- Porque é bem educada! – foi a vez do Novais.
Mas mudou de assunto:
- É verdade! O António tem aparecido?
- Não! Felizmente, parece que arranjou uma mulher da laia dele – informou a Rosa.
- E já falou com o Dr. Brandão? – inquiriu o homem.
- Vou falar com o advogado na segunda-feira, às sete da tarde – disse a mulher.
- Óptimo! Veja se se livra desse homem que tinha o descaramento de ser violento para si. Devia era ser preso! – afirmou, peremptório, o Zé.
- Não gosto de falar nele, senhor Novais – como que pediu a mulher.
- Não se fala mais nele. Tem razão, Rosa. Desculpe! – corrigiu-se o quinquagenário.
- O senhor Novais desculpe, mas hoje parece o homem que conheci nas semanas antes de vir para cá a dona Cristina. Gosto mais de o ver assim: bem disposto e sorridente – arriscou forte a empregada.
- Pois! Mas agora sou eu quem não quer falar no assunto. Mas posso dizer-lhe que não estamos zangados. Talvez um dia lhe fale sobre isso. Por enquanto não – esquivou-se o homem.
E continuou:
- Olhe! Hoje há lista?
- Não, hoje não! – respondeu ela.
- Então vou deixá-la a fazer o seu trabalho que eu vou fazer o meu.
E foi acabar de se arranjar antes de sair.
Ela ficou a pensar:
- Acho que não vai faltar muito para ele se atirar a mim. Vou dar uma ajudinha.
E sorriu, feliz.
Por sua vez, o Zé foi para o seu Peugeot a cogitar:
- O João é que tinha razão! Para mim, nesta fase da vida, esta pode ser a mulher ideal. Se a tenho já quasi em casa, para quê andar a procurar outras por fora? Mas tenho de saber primeiro qual o resultado dos testes e depois falar com a Cristina.

Os dias foram passando muito iguais.
Por vezes, o José Novais cruzava-se com a vizinha. Cumprimentavam-se com um beijo, falavam de trivialidades e cada um seguia o seu caminho. O viúvo evitava ir à agência. Aliás, neste momento, não queria saber de viagens. Isso ficaria para depois.
Uma manhã, mais precisamente na manhã do dia onze de Outubro, uma terça-feira, depois de ter sentido uma indisposição gástrica durante a noite que lhe roubou cerca de duas horas de sono, o Zé não acordou ao som da música pois tinha desligado o despertador para poder dormir mais um pouco.
Quando a Rosa entrou, à hora habitual, não ouviu nenhum ruído. Espreitou e não viu luz vinda do quarto do dono da casa. Achou estranho, mas pensou:
- Deve estar a dormir.
Mas como o silêncio continuasse meia hora depois, ocorreu-lhe que o Novais poderia estar doente, ter tido um ataque, estar morto.
Esta ideia deixou-a preocupada, por isso resolveu ir espreitar e averiguar o que se passava.
A porta do quarto estava meia aberta, meia fechada. Era assim que o José dormia desde que casara, pois a Guida queria ouvir os ruídos que vinham do resto da casa. Tinha medo dos “ladrões”, desde pequena.
A empregada caminhou pelo curto corredor que tinha um quarto do lado esquerdo, que o Zé convertera em escritório e onde dormira durante as últimas semanas de vida da companheira da sua vida e, do outro, uma casa de banho. Ao fundo ficava a porta do quarto do proprietário. Dentro deste havia uma outra que dava para o compartimento da higiene pessoal.
Quando a empregada chegou junto da zona privada do patrão verificou, com a ténue luz que entrava por uma só frincha da persiana, que havia alguém na cama.

Tentou escutar a respiração mas não ouviu nada.
Aproximou-se mais da cama. Devagarinho.
Continuou sem ouvir nada.

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

O viúvo - parte XV

O José Luís passou a manhã desassossegado.
O enigma que ficara no ar deixara-o preocupado e inquieto.
Depois de almoçar frugalmente voltou para casa bem antes das duas horas. Não queria que a Rosa o visse a entrar em casa da vizinha.
Assim, quando tocou na campaínha eram duas menos um quarto. Ninguém respondeu ou abriu a porta.
- Será que saiu e ainda não voltou? – pensou, nervoso.
Tocou novamente.
Desta vez ouviu um ruído e a porta abriu-se.
- Olá, Zé Luís! – disse a mulher, com a sensação de que aquela forma amistosa de o chamar não ligava muito bem com o que soubera na noite anterior.
- Olá, Cris! – e entrou.
- Anda sentar-te aqui na sala – orientou a jovem mulher.
E ela sentou-se num sofá e indicou-lhe o outro. Cris tinha ocupado propositadamente o maior com roupa e outra tralha.
- Então diz-me lá o que se passa! Estou em pulgas – pediu o homem de meia-idade.
- Tu conheceste alguma mulher da tua idade, em Luanda, chamada Laura? Maria Laura Marques – perguntou.
O Novais pensou só uns segundos, olhou para ela, e disse:
- Laura? Sim, conheci. Mas relativamente mal.
- É a minha mãe! – disse a morena com os olhos muito brilhantes.
- Meu Deus! Como o mundo é pequeno – exclamou o Zé.
- E tiveste relações com ela, não tiveste? – perguntou ela.
- Como sabes? Foi a tua mãe quem to disse? – espantou-se o Novais.
- Claro! Eu ainda não era nascida. Nasci nove meses depois – disse a vizinha intencionalmente.
- Mas...por amor de Deus! Não me digas...não pode ser! – gaguejou o homem, apanhado de imprevisto.
- Não há a certeza!
- Bom! – e largou um profundo suspiro, o Zé.
- Mas ainda há essa possibilidade.
- Mau! Não me deixes nesta angústia, por favor! Diz tudo! – disse o Zé já num tom um pouco agressivo.
E a Maria Cristina contou-lhe tudo o que a mãe lhe tinha dito na véspera.
O Zé, conforme ía ouvindo, ía-se remexendo no sofá e pediu mesmo um cigarro à mulher.
Acabada a narrativa, ela disse:
- Portanto, para acabar com as dúvidas, temos de fazer um teste de ADN para determinar se és ou não o meu pai.
- Pois! Pois claro! – balbuciou o homem
E acrescentou:
- Mas que puta de vida! Que mais me irá acontecer! – e já não suspirava, antes bufava.
- Tem calma, Zé! – disse ela – queres um calmante?
- Não, não é preciso...
- Queres tratar disso? Depois dizes-me em que dia se faz o exame, ok? – perguntou a angolana.
- Vou já tratar disso! – disse o Zé, levantando-se.
E acrescentou:
- É melhor não nos vermos mais, até se saber o resultado.
- Ó Zé! Vamos lá pensar: se fores o meu pai, o que aconteceu é para esquecer e ficas a ter uma filha que nunca tiveste; se não fores, não há problema de maior. Se pensares assim ficas mais calmo. Mas acabaram os contactos íntimos, evidentemente. – aconselhou a rapariga.
- Tens razão! Olha, vou já tratar do assunto. Sabes onde se fazem os exames?
- Não! Mas podes telefonar para o Centro de Saúde que te devem dizer – disse a mulher que estava mais calma e conseguia raciocinar melhor.
- Pois! Vou mesmo lá! Eu depois telefono-te – deu um beijo na face da vizinha e saiu.
Pouco depois saiu a morena para se dirigir ao trabalho.
Eram cerca das cinco da tarde quando o celular de Cris tocou:
- Sim?
- Sou eu, Cristina! Já marquei a colheita para amanhã de manhã – disse o Novais.
- A que horas e onde? – perguntou ela.
- Às nove horas, em jejum, no Instituto de Genética junto ao Hospital Maria Pia – esclareceu o homem.
- Está bem! – disse a vizinha – mas não sei muito bem onde é.
- Se quiseres dou-te uma boleia – sugeriu ele.
- Muito bem! Saímos de casa às oito e meia? – quis saber a mulher.
- É melhor sair às oito. Mais vale chegar adiantado do que atrasado – insistiu o Zé.
- Eu acho que é cedo demais, mas se tu queres, tudo bem! – conformou-se ela.
- Então às oito eu toco à tua campaínha. Ah! Parece que só passado cerca de um mês é que dizem o resultado – informou o viúvo.
- É tão demorado? – foi agora a vez de a Cristina se mostrar impaciente – pensei que fosse mais rápido.
- Pois é! Temos de viver angustiados durante um mês – disse ele, desanimado.
- Pronto! Está combinado! Agora vou trabalhar senão a Lena ainda me põe na rua – brincou ela para camuflar o seu verdadeiro estado de espírito.
- Então adeus e até amanhã – concluiu o homem.
E desligou.
De imediato, a funcionária da agência de viagens telefonou para a mãe.
- És tu, mãe? Sou a Cristina!
- Sou eu, sou! Que se passa? – perguntou a viúva.
- É para te dizer que amanhã já vamos os dois fazer o teste – e não especificou para evitar ser ouvida por terceiros.
- Ainda bem! E quando se sabe o resultado? – quis saber a Laura.
- Demora bastante tempo. Um mês! – esclareceu a filha.
- Tanto tempo? Não haverá um processo de pedir com mais urgência? – disse a mais velha, demonstrando assim que também estava tomada de ansiedade.
- Oh mãe! Se isso fosse possível podes ter a certeza de que o Zé teria pedido uma análise urgente – ripostou a filha.
- Tens razão! Mas agora, ao fim destes anos todos, sinto-me diferente e estou ansiosa por saber o resultado – justificou-se a progenitora.
- Pois vais ter de aguentar! Também quem esperou trinta e cinco anos pode esperar mais um mês, não é? – ironizou a filha.
- Ora! Deixa-te disso! – disse a mãe com um tom pouco amistoso.
- Tens razão! Desculpa a piada de mau gosto.
E concluiu:
- Pronto, mãe. Agora vou trabalhar senão a minha amiga Maria Helena ainda me despede. Adeus. Um beijinho.
- Adeus, minha filha! – e a mãe desligou.
Passados uns momentos saiu uma cliente e a Cris dirigiu-se à amiga:
- Oh Lena! Amanhã vou ter de vir outra vez mais tarde. Tu desculpa-me eu ter começado a trabalhar e estar a faltar de uma maneira inadmissível. Mas é uma questão da maior importância para mim e para a minha mãe. Agora não te posso dizer nada. Talvez um dia...Olha! São coisas da vida!
- Não te preocupes. Eu já percebi que anda qualquer coisa no ar. Mas não te preocupes porque estamos no final de Setembro e há menos que fazer. Eu tenho dado conta do recado e tu tens aprendido com muita facilidade. Aliás, conhecendo-te como conheço, não me admiro nada – rematou a dona da agência.
Nessa noite, a Laura, o José Novais e a Cristina dormiram cada um em sua casa. Sozinhos. Mas todos adormeceram a pensar no mesmo assunto.

domingo, fevereiro 12, 2006

O viúvo - parte XIV

- O quê, mãe? Então o meu pai não é o meu pai? Meu Deus! – exclamou, nervosa, a filha.
- Se te acalmares e me ouvires vais ficar a saber tudo. E eu vou ficar muito mais aliviada – disse, falando devagar, a mais velha, e tentando mostrar um à vontade que não tinha.
- Está bem! Olha! Não quero comer mais. Agora só quero ouvir essas revelações – e a Cristina poisou o queixo sobre uma mão, com o cotovelo apoiado na mesa e olhando fixamente a progenitora.
- Quando era nova, era um bocado levantada. Não sei se do sangue africano que me corre nas veias e também corre nas tuas e nas da Teresa. Embora namorasse com o Raimundo, saía amiúde com outros rapazes. E algumas vezes chegávamos ao fim, percebes?
- Claro que percebo, mãe. Continua! – disse, em tom impaciente, a Cris.
- Eu tomava a pílula anticoncepcional que naquela altura era muito forte mas, como também bebia bastante, várias vezes esquecia-me de o fazer. Felizmente, depois soube controlar-me e reger a minha vida de forma mais sóbria.
E continuou, perante o olhar atentíssimo da filha:
- Num dos últimos dias de Outubro de sessenta e nove, fui a uma festa onde estava uma rapaz, tropa, que eu achava um encanto. Chamava-se José Luís Novais. Uns dias antes tivera uma birra com o Raimundo e deixei de lhe falar. Deve ter sido uma parvoíce qualquer pois já nem me lembro do que foi.
Fez uma pausa e respirou fundo.
- Continua, mãe, por favor! – rogou a mais nova.
E a quinquagenária continuou:
- Estive bastante tempo a dançar e a conversar com o rapaz. O teu pai, o Raimundo, nem apareceu. Bebemos bastante e, já bem tarde na noite, fomos até à Ilha do Cabo, bem lá perto da Barracuda, e na areia tivemos relações. Adormecemos mas, passado pouco tempo, com o abaixamento da temperatura, ele acordou e disse-me para irmos embora. Levou-me a casa onde dormi profundamente.
- E pensas que podes ter ficado grávida nessa noite? – quis saber, inquieta, a Cristina.
- Sim! Porque, de facto, quando tive a birra com o Raimundo, disse-lhe: e escusas de me procurar mais; até vou deitar as pílulas fora. E assim fiz. Pelo que andei três ou quatro dias sem a tomar.
- Meu Deus, mãe! – e a filha abanou a cabeça em sinal de reprovação.
- Bom! Quando acordei, em casa, já passava do meio-dia. Mas só algum tempo depois estava com cabeça para pensar, e ocorreu-me que poderia estar grávida. Não tinha qualquer certeza e o Zé Luís iria voltar para o continente poucos dias depois. Que é que eu pensei? Vou ter com o Raimundo, peço-lhe desculpa e faço amor com ele. Se não ficar grávida, tudo bem. Se ficar, o pai será o Raimundo – revelou a mãe de Cris – e assim fiz.
- Isso é um tanto maquiavélico! – disse a filha.
- Reconheço que sim – prosseguiu a mulher – pouco depois confirmei a gravidez e casei imediatamente com o Raimundo que sempre foi o homem que amei.
- E não pensaste em fazer um aborto? – perguntou a filha – seria uma atitude muito habitual para uma situação dessas.
- Pensei, claro! – respondeu a Laura – mas, por um lado senti que seria bom ter um filho do Raimundo, e por outro, tive medo de o perder caso ele viesse a saber. A minha cabeça ficou muito confusa, como deves calcular; só tinha a certeza que queria ficar com o Raimundo e optei por fazer o que fiz. Pode não ter sido o mais correcto ou racional, mas foi o que decidi.
- Acho que te percebo, mãe – disse a Cris.
E a mulher mais velha continuou:
- Deixa-me acabar de contar. Em Julho nasceste tu. Nunca tive coragem para falar nisto a ninguém. A ninguém, mesmo. Hoje é a primeira vez que abordo o assunto. A ideia inicial foi evitar que te envolvesses com um homem que pode ser o teu pai. Mas, agora, acho que tenho de te pedir perdão por nunca antes te ter dito a verdade. Ao teu pai, quero dizer, ao Raimundo, nunca teria tido coragem. Mas após a morte dele, devia ter falado contigo.
E a Laura começou a chorar e a soluçar profusamente.
A filha levantou-se, abraçou-a pelas costas e também rompeu em pranto.
A cena tinha alguma coisa de patético.
Ao fim de alguns minutos a mãe suplicou:
- Perdoa-me minha filha. Perdoa-me, por favor!
- Oh mãe! Quanto deves ter sofrido com esse segredo escondido no teu peito uma vida inteira! Claro que te perdoo, querida mãe. Dá cá um beijinho.
- Obrigado Cristina! Como me sinto mais aliviada! – disse, ainda a soluçar, a mãe – por um lado porque me confessei a ti. Nem aos padres falei nisto, sabes? Por outro porque me perdoaste. Obrigado, minha filha.
- Vamos sentar-nos no sofá! – sugeriu a Cristina – e, se quiseres, eu durmo cá hoje.
- Era bom, era! – agradeceu a mãe.
Sentaram-se no sofá da sala e, pouco depois, disse a filha:
- Tu sabes que agora é fácil saber se o Zé Novais é ou não meu pai e com elevado rigor. Fazendo um teste de ADN.
- Claro que sei! Mas para isso é preciso ter a colaboração do Zé – falou a Laura.
- Eu falo com ele e conto-lhe tudo. Ou preferes ser tu? – disse a Cristina.
- Não! Prefiro não me encontrar com ele até se saberem os resultados do teste. Depois se verá! – optou a mulher de meia-idade.

Na manhã seguinte, terça-feira, vigésimo dia de Setembro, Cristina tocou na campaínha do vizinho ainda não eram nove horas.
O Zé, tinha acabado de fazer a higiene e estava já vestido. Aproximou-se da porta e perguntou:
- Quem é?
- Sou eu, a Cristina!
- Um momento – disse o viúvo e logo franqueou a entrada à sua amante.
- Bom dia, Cris! – e quando ía beijar-lhe os lábios ela desviou-se ligeiramente. O suficiente para o beijo cair na face.
- Bom dia Zé! – disse ela.
- Há alguma novidade? Nunca apareceste aqui a esta hora – disse o dono da casa enquanto fechava a entrada.
- Preciso de falar contigo com urgência mas também com calma. A tua empregada está cá a que horas?
- Das nove às onze, como todos os dias.
- E não há alguns dias em que vem cá de tarde? – insistiu a morena.
- Sim! Às terças e quintas vem das duas às quatro. Hoje é terça, não é? Então estará cá – esclareceu o Novais.
- Olha! Podes estar em minha casa às duas? – perguntou ela.
- Posso! Mas passa-se alguma coisa de especial. Não o podes negar. Algum problema com a tua mãe? – indagou o homem.
- Não está ninguém doente nem nada disso. Mas é importante para mim, para ti e para a minha mãe – disse a Cristina deixando o vizinho ainda mais intrigado.
- Mas não podes dizer alguma coisa?
- Não! Temos de estar com calma e sossegados. Eu peço à Lena para me deixar entrar mais tarde.
Eis que se houve a porta do apartamento a abrir. A Rosa entrou. Ao deparar com os dois estacou, olhou-os e disse secamente:
- Bom dia!
- Bom dia, Rosa! – e logo acrescentou o patrão – esta é a nova vizinha, a D. Maria Cristina. E esta é a Rosa, de quem já te falei.
Foi a Cris quem tomou a iniciativa de saudar:
- Bom dia, Rosa! Muito prazer! – disse.
- Igualmente! – respondeu a Rosa com um sorriso forçado.
E retirou-se para a cozinha, dizendo:
- Com licença! Vou-me preparar para o trabalho.
- Até já, Rosa! – disse o homem.
- Bom! Então estamos combinados, não é verdade, Zé? Vou para a agência.
E saiu.
O José Novais ficou em pulgas.
- Mas que é que terá acontecido? – falou para consigo.
Tomou o pequeno-almoço e só perguntou à empregada se havia lista. Havia.
E saiu com um simples:
- Adeus, Rosa!
Esta ficou a matutar:
- Aqui houve coisa! É limpinho! Pode ser que o namoro acabe depressa!
E esta ideia deixou-a mais feliz.
Começou a cantarolar.

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

O viúvo - parte XIII

No dia seguinte, segunda-feira, Maria Cristina telefonou à mãe e disse-lhe que à noite iria a casa dela. Combinaram que lá estaria por volta das sete e meia, jantariam e conversariam.
E assim aconteceu.
Maria Laura Marques tinha completado cinquenta e oito anos em Julho.
Era de Luanda e filha de cabrito e mulata, pelo que seria uma mulata clara. Teria muitos cabelos brancos se não os escondesse com uma coloração castanho escura cujo tom, aliás, não a favorecia muito.
Os olhos eram muito negros.
Era ligeiramente mais baixa que a filha Maria Cristina e estava um pouco gorda.
Não era muito bonita e estava desgastada para a idade.
A vida não lhe fora muito fácil, mas um curso comercial tirado em Luanda foi uma boa ajuda para progredir na empresa de louças e cristais onde começou e continua a trabalhar, no Porto. Agora tem um lugar na Contabilidade.
Era como secretária que trabalhava em Luanda quando casou, em Dezembro de sessenta e nove, tinha vinte e dois anos, com Raimundo Lopes Soares, empregado numa firma de ferragens e que, na altura, tinha trinta e dois anos. Era de estatura média e magro.
Namoraram três anos e ele adorava-a.
Também ela gostava dele, mas era uma cabeça um pouco levantada demais para a época, mesmo em África onde o clima é mais propício a devaneios amorosos, e tinha namoricos simultâneos com o Raimundo e outros rapazes.
Em fins de Julho de setenta tiveram a primeira filha, Maria Cristina e em Março de setenta e três a segunda, Maria Teresa.
Em Setembro do ano seguinte ao da revolução dos cravos toda a família veio para o continente; mais precisamente para o Porto, após uns dias de permanência em Lisboa.
Enviuvou em Setembro do ano dois mil.
O Raimundo tinha na altura sessenta e três anos e ela menos dez, naturalmente. A falta do seu companheiro sentiu-a, e muito.

A campaínha do apartamento de Laura soou quando passavam poucos minutos das sete e meia.

- É a Cristina! – adivinhou a mulher enquanto limpava as mãos ao avental e deixava a cozinha dirigindo-se em direcção à porta.
Abriu-a e a filha entrou:
- Olá mãe! – abraçou-a e beijou-a – então continua tudo bem?
- Felizmente não me queixo de nada. Só do trabalho, que é muito. Mas vou ver se faço um acordo com a empresa para me reformar aos sessenta anos – disse com um brilho no olhar.
- Mas não tem de ser aos sessenta e cinco? – interrogou a filha.
- Enquanto não sair uma nova legislação posso escapar-me. É isso que muita gente está a fazer e eu vou tentar.
- Mas isso seria óptimo. E trarias o máximo de reforma?
- Sim! Sem penalizações – disse risonha a mãe de Cris – vamos para a cozinha que eu estou a preparar o jantar.
- E que há para comer, mãe? Coisa boa, como sempre, não? – quis saber a sensual morena que mostrava bastantes semelhanças fisionómicas com a Maria Laura.
- Nada de especial. Um arrozinho seco e umas costeletas de porco panadas.
- Tu sabes que adoro roer essas costeletas, velhota! És um amor de mãe! – e beijou a progenitora de novo.
- Que é feito da Teresa? – perguntou a jovem mulher.
- Tu sabes como ela é! – disse a viúva – aparece, desaparece, telefona, não telefona, está no escritório, está em viagem, está em Portugal, está no estrangeiro...enfim!
- Deixe-a gozar a vida agora, mãe!
- A vida é dela – disse a mais velha – mas uns conselhos tenho obrigação de dar. Há asneiras que se podem evitar.
- Pois! – respondeu a mais nova – mas com a idade ela deve ir assentando. Comigo deve acontecer o mesmo.
E riu-se com prazer.
A Maria Laura sorriu e perguntou:
- Mas então já estás totalmente instalada no novo apartamento?
- Faltam umas coisitas, mas o principal já está – e continuou – aliás quero que vás lá jantar comigo uma noite destas.
- Claro que irei com todo o prazer!
Entretanto a comida já estava quasi pronta e a mãe disse para a Cris:
- Olha! Vai-te sentando na mesa que eu vou só colocar as coisas nas travessas e vou já fazer-te companhia. Podes pegar na bebida que quiseres. Eu vou beber o meu copito de maduro, como de costume.
- Eu também bebo do mesmo – disse a Maria Cristina – vou lavar as mãos.
Pouco depois estavam as duas sentadas à mesa.
Conforme íam comendo, conversavam:
- E então a ruptura com o Jaime é definitiva? – perguntou a Laura.
- Completamente. Essa relação morreu e já foi enterrada.
- Já tens trinta e cinco anos. Está na altura de arranjares um companheiro para o resto da vida. E dares-me um netinho.
E prosseguiu:
- Se me reformar, era um bom processo de passar o tempo. Olhar pelo neto.
- Calma, mãe! Ainda não sou velha! – e riu-se, a vizinha do Zé.
- Olha que o tempo corre veloz! – sentenciou a mais velha.
- É verdade! Sabes que travei conhecimento com um vizinho que é da sua idade? – perguntou a empregada da agência de viagens.
- E tu já me tinhas dito? Não! Então como haveria de saber? – questionou com toda a lógica a Laura.
- Ó mãe! Já sabes que é uma maneira de dizer.
- Eu sei! Eu sei!
- É um viúvo, que vive sozinho e que é uma simpatia. E bem parecido, o raio do homem – avaliou a filha.
- Não me digas que agora se segue um velho da minha idade. Ai que tu nunca mais ganhas juízo, rapariga! – disse sorrindo, mas revelando uma certa apreensão, a mãe.
- Não é nada disso! Mas já o convidei a ir lá a casa jantar quando a mãe for. Ele esteve a fazer a tropa em Luanda e veio embora em...salvo erro em Novembro de sessenta e nove. Mais ou menos um mês antes de os pais casarem.
- Interessante! E como é que se chama o sujeito? – perguntou a viúva.
- Zé! José Luís Novais – respondeu a filha com toda a naturalidade.
A mãe parou de comer.
Fez uma expressão estranha que deixou a filha apreensiva.
- Que foi, mãe? Não te sentes bem? – Maria Cristina quis saber a causa daquela reacção tão inesperada.
- Tens alguma fotografia dele? – perguntou a Laura.
- Por acaso tenho. Espera um bocadinho que vou à bolsa buscá-la. Mas o que se passa? Conheces-lo? Olha, aqui está! – e a jovem mulher entregou à mãe uma foto que o Zé lhe dera.
A Laura olhou atentamente e acabou por dizer:
- Está mais velho mas é ele. É o Zé Luís! – afirmou num tom angustiado.
- Mas que se passa mãe? Há qualquer coisa que te perturbou.
- Pois!
E fez uma pausa, deixando que a cabeça repousasse sobre as mãos e com os cotovelos apoiados na mesa.
- Pois, o quê, mãe?
- Não sei o que te dizer. Espera. Deixa-me pensar uns minutos – pediu a mais velha das duas mulheres.
- Pronto! Pensa! Está à vontade e acalma-te.
Seguiu-se um silêncio sepulcral que só foi quebrado pela voz sumida da mãe que disse:
- Tenho que te contar a verdade que trago escondida no meu peito desde essa altura. Desde quando tu foste gerada.
- Que se passou, mãe?
- Eu já te vou contar com mais pormenores. Mas desde já te digo uma coisa: esse homem pode ser o teu verdadeiro pai!

terça-feira, fevereiro 07, 2006

7 de Fevereiro

“Irreverência, humor, criatividade, non-sense, ousadia, experimentalismo. Mas tudo pode aparecer aqui. E as coisas sérias também. O futuro dirá se valeu a pena...ou melhor seria ter estado quietinho, preso por uma camisa de forças!”

Foi isto que escrevi como linha orientadora do blog “Eu sou louco” quando o criei no dia 7 de Fevereiro de 2005.

Faz hoje um ano!

Esse subtítulo mantém-se o mesmo, mas o conteúdo é de 126 posts.
Todos de texto em prosa.
Sem fotografias, nem música, nem vídeo.
O mais simples possível.
Quis que este sítio valesse só pelo que aqui fui deixando escrito.
Utilizei os mais variados temas e assuntos:
Memórias, muitas memórias, histórias verdadeiras, muitas vezes com um toque humorístico e pretensões de fazer sorrir ou mesmo rir, algumas um pouco loucas. Mas também crónicas, artigos de opinião, ficção, abordagens mais pessoais e íntimas, eu sei lá...
Chorei ao escrever um ou dois, mas ri-me sozinho muitas mais vezes.

Imensos são os comentários que aqui estão. Também fazem parte do património.
Um obrigado a todos aqueles que os deixaram por cá...e não foram poucos.
Para mim é importante ter um “feed-back” do que coloco on-line. O que escrevi foi sempre para os que me quisessem ler, tentando usar uma linguagem que fosse compreensível. Não escrevo para mim. Foi e será sempre essa a minha opção.
Se não tivesse leitores não valeria a pena escrever.
Também agradeço aos que o fizeram mas não comentaram. São alguns. Não sei se muitos, se poucos. Preferia que tivessem deixado a sua marca, mas tenho de aceitar as opções de cada um.

Ao longo destes doze meses conheci aqui muitas pessoas. Algumas tive oportunidade de conhecer também lá fora, no chamado mundo real.
Fiz amizades.
Foi bom!

“...O futuro dirá se valeu a pena...ou melhor seria ter estado quietinho, preso por uma camisa de forças!”

Sinceramente, e perdoem-me a imodéstia, acho que valeu a pena.

Mas se algum dia, próximo ou afastado, acharem que já não vale mais a pena, rogo-vos que me prendam à camisa de forças.
Mais!
Não me deixem morrer aos bocadinhos: eutanásia para o António, que vos adora!

sábado, fevereiro 04, 2006

O viúvo - parte XII

Terça-feira, décimo terceiro dia de Setembro. O clima continuava ameno. O Zé Luís levantou-se cedo e, quando a Rosa chegou, às nove em ponto, já ele tinha tomado a primeira refeição do dia e estava pronto para sair. Só não o fizera antes porque esperava saber se a empregada tinha alguma lista de compras.
- Bom dia, Rosa! – saudou o patrão.
- Bom dia, senhor Novais! – respondeu a Rosa, num tom contristado.
- Que se passa consigo, mulher! – perguntou o viúvo, como se não percebesse.
- Estou um bocado adoentada – esclareceu.
- Comeu alguma coisa que lhe fez mal? – perguntou o homem.
- Não, senhor Novais! – e continuou com ironia, a empregada – o senhor é que pode ter alguma indigestão.
Calou-se imediatamente. Percebeu que tinha ido longe de mais e agora restava-lhe esperar que o José não levasse a mal.
- Ai Rosa, Rosa! Parece que está com ciúmes.
A mulher teve vontade de agarrar o pescoço do patrão e apertá-lo até ele ficar morto no chão da cozinha.
- Eu? Ciúmes? Da vizinha? – interrogou com voz de desprezo – para sua informação, ontem fui espreitar à agência de viagens para ver como andava o seu gosto, senhor Novais, e acho que ele anda muito mau. Se quer mulher, há por aqui outras bem mais interessantes.
A empregada nem meditou bem em tudo o que dissera. Caíra na rasteira do Zé.
Mas agora foi a vez dele ter ganas de lhe dar uma marretada na cabeça.
- Rosa! Você fez isso? – disse o irritado Zé.
- Pois! Não posso ir espreitar à agência de viagens? – ripostou ela.
- Não é isso! É andar a cocar uma senhora que é minha vizinha só para a denegrir perante mim – criticou o Zé.
- Denegrida já ela está! – ironizou a despeitada mulher.
- Bom! Vamos mudar de assunto – disse ele – mas então está adoentada porquê?
- Ah! São coisas de mulheres! – respondeu – obrigado pelo cuidado.
- Não tem de quê, Rosa! Tem aí alguma lista?
- Não senhor! Hoje não! – respondeu ela.
O Zé saiu e a mulher começou a chorar.

Na quarta-feira foi a missa do 30º dia do falecimento de Margarida. Já compareceram poucas pessoas, mas a Rosa, o João e a Mina não faltaram. Também apareceu a Maria Helena que tinha sido informada pela Cristina. Mas esta achou que não devia ir. Terminada a cerimónia, e retirados quasi todos os que haviam aparecido e já fora do templo, o viúvo chamou o amigo aparte e disse-lhe:
- Sabes que ando metido com uma morena que é a minha nova vizinha? – confidenciou o Zé.
- Sério? Estás a brincar comigo! – exclamou, surpreendido, o João.
- Não! É verdade! Começou tudo no domingo à noite. Mas não quero entrar em pormenores. A Rosa é que topou a marosca e anda com umas trombas que mais parece um elefante – continuou o Novais.
- Ó pá! Tu és maior e vacinado. Só te quero dizer que não percas a Rosa, pois empregada como ela vais ter dificuldade em encontrar.
- Eu sei! Eu sei! – concordou o Zé – e, para mais, esta relação não deve ser para muito tempo. Ela só tem trinta e cinco anos.
- Ena, pá! Tu estás em forma, rapaz! – e, ao dizer isto, o amigo riu-se a bom rir, chamando a atenção da Mina e da Rosa que estavam a conversar um pouco afastadas.
A Hermínia não pôde deixar de dizer:
- Ó João! Olha onde estamos e o que viemos cá fazer. Vê se tens maneiras.
- Tens razão, mulher! Mas o Zé disse uma boa piada – disfarçou ele.
E as confidências ficaram por aqui.
Despediram-se e o Zé ofereceu boleia à empregada, mas esta recusou:
- É muita maçada. Eu vou a pé. É perto e bom caminho.
- Olhe que não me custa nada – insistiu o patrão.
- Agradeço muito mas não é preciso. Até amanhã, senhor Novais.
E afastou-se. O viúvo ficou a olhar para ela e disse para consigo:
- Tenho de a tratar bem. Pressinto que ainda me vai fazer muita falta no futuro.

Na quinta-feira foi jantar com a Cristina, depois foram ao cinema e estiveram enredados em jogos de sedução e sexo até quasi às duas da manhã.
Tirando os acontecimentos especiais, toda a semana foi passada como habitualmente: uma conversinha com a empregada de manhã, as saídas do costume, compras, telefonemas e visitas para acompanhar o estado da sogra que não registava melhoria, ginásio, leitura, música, bilhar e a novidade de uns telefonemas para a Cris preenchidos por umas trocas de palavras e elogios mútuos, breves mas calorosos.

Domingo, décimo oitavo dia de Setembro, os dois vizinhos resolveram ir almoçar fora. Fazia uma semana que tinham estado de forma muito íntima pela primeira vez. Depois da refeição foram até Matosinhos, deram uma volta a pé e regressaram a casa por volta das quatro e tal.
- Anda para minha casa – disse ele.
- Daqui a pouco! – respondeu a mulher – vou arrumar umas coisas. Depois, se quiseres, eu faço lá umas sandes, comemos, conversamos e depois fazemos o que nos apetecer.
- De acordo – respondeu o viúvo.
Por volta das seis e meia Cristina tocou à campaínha do apartamento do vizinho e entrou depois de este lhe abrir, solícito, a porta.
Trazia, de novo, o cabelo bem molhado e todo penteado para trás, uma blusa muito parecida com a de oito dias antes mas, em vez de uns jeans, trazia vestida uma muito curta saia branca.
- Esta mulher hoje parece um anjo! – pensou, embevecido, o José Luís.
Foram para a cozinha onde prepararam uma frugal refeição. Usaram a mesa que aí estava em vez de irem para a sala. Só depois de terminado o pequeno jantar e terem estado uns minutos à janela, é que se sentaram nos lugares que pareciam estar já reservados.
Foram conversando sobre vários assuntos até que a Cristina disse:
- Ó Zé! Tu vieste de Luanda quando?
- Em Novembro de sessenta e nove – respondeu ele.
- É giro que os meus pais se casaram em Luanda em Dezembro desse ano. A minha mãe, que é da tua idade, pois nasceu em Julho de quarenta e sete, tinha vinte e dois anos, e o meu pai tinha trinta e dois anos. Como vez, a tendência para homens mais velhos é genética.
O Zé mantivera-se calado a ouvir a companheira, mas não podia deixar de ir apreciando o belo corpo de mulher tão generosamente oferecido aos seus olhos.
Finalmente interveio:
- E a tua irmã?
- A Maria Teresa tem trinta e dois anos, é solteira e ainda mais liberal do que eu em matéria de comportamentos. Teve nem sei quantas relações, quasi sempre com homens mais velhos. Já engravidou uma vez mas abortou. Meu querido! Acho que a vida dela é que dava mesmo um filme.
- Faz ela muito bem! É o que se leva desta vida, mas convém acautelar o futuro – sentenciou o Zé.
- Não te preocupes que ela tem um bom emprego no Porto e já tem um flat mesmo ao lado do da minha mãe. E um bom carro. E tem viajado por tudo o que é sítio. Mas não é meretriz de luxo, cuidado! Sabe é escolher bem os parceiros.
- Bom! Se é assim já cá não está quem falou – redimiu-se o Novais.
- É verdade! Vou falar em ti à minha mãe. Gostarias de a conhecer? – perguntou a vizinha.
- Com certeza! E não deve ser difícil. Se ela vive no Porto...
- Ela é mulata, mas clara. Eu sou cabrita. Como vivi quasi sempre aqui, num clima mais frio, não tenho a cor que teria se sempre tivesse habitado em África – esclareceu a Cris.
- Já tinha notado isso. Parte da tua grande sensualidade deve estar no sangue africano que te percorre – disse o homem.
- Então, um dia destes vou a casa da minha mãe, aproveito para lhe falar de ti e convidá-la para um jantar com os três, na minha.
- De acordo! – concluiu o Zé.
- Zézinho querido! Anda para junto de mim, aquecer-me – diz Cristina num tom de voz sensual.
E o José Luís, já excitado, abraçou a sua parceira.

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

O viúvo - parte XI

O Zé Luís olhou para os seios fartos que pareciam querer saltar de dentro da blusa. Para os bicos que quasi perfuravam o tecido. Para a boca cujos lábios eram humedecidos pela língua num movimento lento e excitante. Para os olhos semicerrados.
Tocou nos pés descalços, olhou para eles e viu que eram pequenos e perfeitos, sem pintura nas unhas, a tez escura contrastando com a alvura da pele da planta. Acariciou-os lentamente, com ambas as mãos, enquanto olhava para o corpo da mulher. Viu a deitar fora o cigarro e poisar o copo de whisky.
- Esta blusa está um pouco apertada – disse ela.
E, com um movimento dengoso de ambas as mão desapertou dois botões. Foi o suficiente para que os seios redondos se afastassem deixando ver um desfiladeiro que apetecia atravessar.
O Zé pegou nos pés dela e colocou-os sobre o seu falo que endurecera rapidamente perante aquela visão e aquele contacto de que não desfrutava há muito.
Cristina começou a movê-los muito lentamente. O Zé esticou as pernas e recostou-se ainda mais.
A mulher, de repente, deu um salto e deitou-se sobre o homem ávido de carícias. Os seios, saltaram da blusa e ele não resistiu a tocar-lhes e em beijar e chupar um mamilo; depois outro.
Mas rapidamente a boca sensual da Cristina se colou à dele, ambas entreabertas e convidando a que as línguas se tocassem, se guerreassem de forma violenta. As mãos de cada um agarravam com força a cabeça do outro. Pararam para respirar melhor. Repetiram o beijo duas vezes. Por fim, o Zé aproveitou para se descalçar, tirar a camisa e desabotoar as calças.
- Espera! – disse ela – eu dispo-te o resto.
E, sempre devagarinho, removeu as calças do homem. Depois as cuecas. O Zé estava nu e com um verdadeiro canhão municiado entre as pernas.
Depois, ela retirou a sua blusa e disse:
- Tira-me as calças, por favor. São muito justas.
- Sim, amorzinho – sussurrou o macho.
E, não sem alguma dificuldade, removeu-lhe as calças deixando bem visíveis umas pernas fortes. Apalpou as coxas dela e sentiu que eram duras.
- Carne de primeira – pensou.
Agora a sua parceira só tinha vestido um fio dental que fez o Zé perder a cabeça. Deitou-a para trás, tirou-lhe as minúsculas calcinhas e mergulhou a sua cabeça na zona púbica da mulher que, numa cuidada depilação, ela reduzira a uma faixa vertical. Não demorou muito até que a Cristina começasse a soltar gemidos de gozo.
Por momentos ele parou, levantou a cabeça, retirou um ou dois pêlos da boca e disse:
- Queres ficar aqui ou ir para a minha cama?
- Vamos para a tua cama – disse ela e levantou-se toda nua.
Pegou nos cigarros e no isqueiro e disse, apontando para o copo:
- Deita-me aqui mais um bocadinho.
O Zé levantou-se também, serviu a vizinha e verteu mais algum scotch no seu copo. Pegou no balde de gelo e disse:
- Então anda atrás de mim.
E a mulher nua seguiu o homem nu até ao quarto deste.
- Agora deita-te, Zé! – ordenou ela.
Ele assim fez.
Ela ajoelhou-se, começando a beijar-lhe o corpo desde a testa até aos pés. Quando se deslocava já no sentido ascendente, agarrou o pénis do Zé e começou a passar a língua pela glande abundantemente lubrificada. Finalmente, introduziu-o na sua boca. Agora era a vez dele gemer. Mas Cristina sabia bem quando devia parar para evitar um orgasmo antes do tempo. E fê-lo, deixando o Zé completamente desvairado.
Deitou-se ao lado dele e pediu-lhe:
- Salta-me!
O homem não se fez rogado e rolou para cobrir a morena. Ela abriu as pernas e subiu os joelhos. Depois levantou as ancas.
Num ápice o Novais penetrou a Cris. E começou a mover-se lentamente dentro dela. Ao mesmo tempo gemiam baixinho e beijavam-se. Mas os movimentos dele foram-se tornando mais rápidos. Ela também se mexeu mais e mais e mais e os gemidos passaram quasi a gritos e o movimento acelerou, acelerou, acelerou...
Ouviu-se um urro do homem. Um grito prolongado da mulher.

E os movimentos passaram a ser quasi que uma pequena tremura.
Tinham logrado atingir o orgasmo. Ambos. Em simultâneo.
Sublime!
Após alguns segundos em que a respiração passou de ofegante a normal, ela acendeu um cigarro e bebeu um trago. Ele também bebeu e pediu-lhe para dar uma fumaça.
- Zé Luís! – disse ela – tu ainda és um homem do caraças.
Ele olhou para os olhos negros e respondeu:
- Meu Deus! Tu és um milagre!
- Como inauguração, não podia ser melhor – disse ela.
E continuou:
- Agora já escusamos de andar carentes. Aqui ou em minha casa, duas ou três vezes por semana, ou mais, se tu quiseres, podemos conversar, acariciarmo-nos e fazer amor. Gostei de ti, meu Zézinho super gostoso!
- Tu és um portento, minha querida! – disse ele.
- Vamos agora para a sala? Eu amanhã tenho de ir trabalhar, meu madraço; conversamos um bocadinho e depois eu vou para casa.
- Ok! Tens razão! – disse o homem, ainda com as ideias mal coordenadas.
Trocaram os números do telefone, fizeram-se mutuamente mais algumas carícias, conversaram um pouco e, finalmente, ela retirou-se.
O Zé calou o pianista que persistia em tocar e foi dormir também.

Quando acordou olhou para o relógio.
Já eram nove e meia. Esquecera-se de pôr o rádio a despertar.
Vindo da zona da sala ou da cozinha ouviu uns ruídos.
- Deve ser a Rosa a trabalhar. Deve, não! É com certeza! – pensou.
Estava com preguiça demais para se levantar, mas achou que não devia dar a entender o que se passara na noite anterior à empregada.
Mas a mulher já topara que tinha andado fêmea lá por casa: guardanapos e cigarros com batom, louça de duas pessoas...
- O homem trouxe a preta cá para casa. Aposto! – resmungou baixinho.
Só por volta das dez e tal é que o Novais foi para a cozinha tomar o pequeno-almoço.
- Bom dia, Rosa!
- Bom dia! – respondeu secamente a empregada.
- Olha! Não me digam que esta agora está com ciúmes – pensou ele.
E falou:
- Dormi que me fartei, esta noite.
- E também comeu e bebeu e fumou e... – e a mulher conteve-se.
- Pois! Tive visitas.
- E vieram de África! – disse ela com desdém.
- Rosa! Eu gosto muito de si, mas você não tem nada a ver com quem eu convido ou deixo de convidar para minha casa, entendido? – ralhou o homem.
- Tem razão, senhor Novais! Peço desculpa.
- Pronto, Rosa! Já está desculpada. Mas eu sou um homem. Um homem válido, ainda – justificou-se o Zé.
- Parece que sim! – resmungou a mulher que via o seu objectivo de viver com o patrão em perigo.
- Bom! Vou acabar de me arranjar. Até já, Rosa!
- Até já, senhor Novais!
Passado pouco tempo, e depois de acabar de se arranjar, o José Luís saiu.
Pensou em ir até à agência de viagens mas, ponderando melhor, achou que não devia fazer o papel de cachorrinho esfomeado.
E cumpriu a sua rotina.